quarta-feira, 17 de outubro de 2018

O Novo Iluminismo?


Vem à luz, com o atraso de costume em se tratando de nossas melhores livrarias, o badalado O Novo Iluminismo, do canadense Steven Pinker. Chega com o charme de um livro já vitorioso, quer pelo índices de vendagem, quer pela elogiosa receptividade junto ao público mais exigente em publicações do gênero.

 

Não sem razão, pois, e visando a cumprir uma das vocações deste blog, é que me debrucei sobre o livro desde as primeiras horas de ontem, 16 de outubro de 2018, até o final de manhã desta quarta-feira 17, quando, ao final de suas 528 páginas, decido sentar à frente do computador para fazer do livro breves considerações.

 

Trata-se de um estudo vigoroso sobre o mundo contemporâneo em suas diferentes vertentes, amparado, responsavelmente, em dados que possibilitam ao autor fazer uma defesa entusiástica do que define como um novo Iluminismo, ou seja, um período em que a razão, a ciência, o progresso e o humanismo reinantes confirmam a vitória do conhecimento sobre os diferentes males da sociedade. O livro, indisfarçavelmente, como é de se esperar, apoia-se nos valores do liberalismo clássico, e constitui, por isso, um discurso intencional de apagamento das forças ideológicas que se contrapõem ao modelo de sociedade vigente.

 

Mas, por um gesto de correção intelectual, é preciso que se reconheçam as suas imensas qualidades, que vão da elegância do texto ao fôlego dos levantamentos feitos sobre os mais variados temas, como saúde, educação, igualdade de direitos, democracia, violência, relações internacionais, terrorismo, crimes de ódio, intolerância, participação política, representatividade, tecnologia, informação, enfim, uma quase completa visualização da realidade social, econômica e política mundial na atualidade.

 

O Novo Iluminismo, como deixa evidenciado o título, é um livro que surge (coincidência?) num momento em que o pensamento dos integrantes da Escola de Frankfurt parece readquirir novo prestígio nos meios acadêmicos, notadamente Walter Benjamin, Habermas e Theodor Adorno, cujas obras vêm sendo reeditadas com reconhecido sucesso, no Brasil e no mundo.

 

Na contramão do que fizeram esses pensadores, notadamente Adorno e Horkheimer, no clássico Dialética do Esclarecimento, para me referir à pedra angular das ideias centrais dos frankfurtianos, a leitura que Steven Pinker faz do Iluminismo, enquanto exigência de aplicação da razão como forma de compreender o mundo e mobilizá-lo em direção ao progresso e bem-estar humanos, é desafiadoramente positiva.

 

Para Adorno, partindo-se do pressuposto de que o Iluminismo visava, em essência, a libertar o homem do medo, levando-o a tornar-se, pela razão, ciência e técnica, senhor da realidade de fantasias e ilusões até então dominantes, o que se viu foi o contrário disso: o homem tornou-se objeto manipulável da ciência e da técnica, instrumento mesmo do que chamou de "indústria cultural" que impede o desenvolvimento da capacidade crítica das massas.

 

A visão de Steven Pinker é bem outra. Considerando o  Iluminismo atemporal, o intelectual canadense professa que o ideais da razão, da ciência, do progresso e do humanismo como forma de estabelecer o bem-estar de todos, em todos os lugares, são vitoriosos e vivemos, hoje, num mundo indiscutivelmente melhor.

 

Falta ao livro de Pinker, como se vê, uma percepção mais individualizada do que vem acontecendo em muitos países, a exemplo do que se vê no Brasil hoje, onde os valores do humanismo são deixados de lado em favor de um ideário de violência, autoritarismo, ódio aos nordestinos, à mulher e às minorias. E que tende, perigosamente, a ser legitimado pelo voto, o que será  ---  antes de tudo  ---, desumanamente trágico.   

 

 

 

  

 

  

 


 

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