domingo, 13 de agosto de 2023

Meu pai

Éramos oito irmãos, quatro homens e quatro mulheres. O casal mais velho, Odivaldo e Odilma, filhos do primeiro casamento do meu pai. Os outros, pela ordem decrescente, Gracinha, Deusdedith, Emídio, eu, Fátima e Socorro.

Crescemos debaixo de uma educação austera, sobretudo orientada pela inflexibilidade de mamãe, Alderila, mulher temperamental e de atitudes invariavelmente decididas. Papai, Deusdedith Teixeira, homem rigoroso nos costumes, nas opiniões e no caráter, foi o mais íntegro, grave, sério e autodisciplinado de todos os homens que conheci. E, para além de tudo isso, era a humildade personificada.

De papai, aprendemos algumas lições indeléveis: jamais tergiversar depois da palavra empenhada; nunca tirar proveito da fragilidade alheia; não baixar a cabeça ante a prepotência, a arrogância, a valentia de quem quer que seja; em momento algum desejar aquilo que, sendo do outro, não nos pertence; respeitar os mais velhos; ser correto nos negócios, grandes ou pequenos; que a honestidade é um bem supremo; que, todos, somos iguais, ricos e pobres, brancos e pretos; que Deus existe; que mais vale amigos na praça que dinheiro no caixa; que a família é algo sagrado; que nem tudo se acaba com a morte; que nada tem mais valor que a paz; que jamais alguém lhe bata à porta para querer de volta o que é seu; que se deve amar, amar e amar sempre; que o ódio é pior dos sentimentos e não compensa; que se pode dar vazão à emoção, sem pruridos, sem achar que o pranto vai nos diminuir sob qualquer aspecto.

Que belo homem foi meu pai!

Era humilde, nunca abjetamente submisso. Era manso, exemplarmente brando de temperamento, mas corajoso, destemido. A propósito, é conhecida a história: certa vez, ameaçado de morte, a faca no peito, fixou o olhar nos olhos do agressor e ponderou: – "Nêgo, se eu fosse você, não faria essa besteira não". Tratava a todos com um "nêgo" carinhoso. O homem baixou a arma, trêmulo, e sumiu feito um cachorro acanhado, para nunca mais voltar.

A mansidão de papai era contagiante. Jamais negava ajuda a quem quer que fosse, nem mesmo quando lhe pediam, por empréstimo, o 'cavalo preto de Deusdedith'. Solícito, entregava amorosamente o laço: – "É só ir à roça e pegar, o cavalo é seu!", a sela e os arreios deixados à vista. Como só se permitisse ser laçado por seu dono, o cavalo preto ia de um canto a outro da roça, volteava, corria em disparada, saltava, escoiceava, parava ao longe, desafiador. Depois de hora, hora e meia de tentativas frustradas, o solicitante voltava, esbaforido: – "Deusdedith, seu cavalo é muito velhaco." A história virou piada. A piada tornou-se máxima: Mais velhaco que o cavalo preto de Deusdedith!

Éramos uma família de poucos, parcos recursos. Meus irmãos mais velhos passaram por tempos difíceis, os mais novos, não. Nenhum excesso, nada além da medida, do estritamente necessário, mas a mesa farta, a roupa decente, o remédio na hora certa.

Nada nos deixou, além do exemplo. E, no entanto, sentimo-nos imensamente ricos. É bastante lembrar o que esse homem foi!

 

 

 

2 comentários:

  1. Que bela homenagem com razão e emoção!

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  2. Um filho dessa estirpe, só poderia ter por pai, um grande homem! Feliz Dia dos Pais!

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