sexta-feira, 31 de maio de 2024

Ainda sobre a beleza da Arte

Em termos de avaliação da obra de arte, assumo: sou um formalista incorrigível. O que faz de um livro arte não é o tema explorado, mas a maneira como esse tema é apresentado. Um filme é arte, não pelo que diz ao espectador no tempo médio de sua duração, mas como o dito é trabalhado esteticamente, a forma como o diretor (o autor da obra) explorou os recursos de que dispõe, o uso da câmera, o enquadramento, a angulação e movimento da imagem, que é o resultado do manuseio do equipamento e da concepção que ele, o diretor, tem dos sentidos que suas escolhas técnicas terão para o objeto filmado. Assim é com a pintura, a cenografia teatral, a plasticidade dos movimentos do dançarino em sua performance na madeira do palco.

Em seu livro recém-lançado sobre o cinema, Caetano Veloso diz acerca disso algo extremamente relevante: "Sinto decepcioná-los, mas aqui vai como uma notícia: não é o 'ator', e sim o 'diretor', o importante num filme. O cinema é uma estética, é uma arte. E o diretor está para a obra de arte fílmica assim como o pintor está para o quadro. Os materiais de que dispõe um realizador cinematográfico são a câmera, o celulóide, os cenários, as coisas, os atores etc.; [...] é inegável que o ator é um instrumento 'superior'! Nunca igual a um objeto. Porque dele o diretor tira emoções, expressões humanas". Bingo.

Conheço pessoas, mesmo algumas familiarizadas com o cinema, que sabem de cor datas de lançamentos, o guarda-roupa que vestiu o elenco, os gestos e trejeitos de uma atriz, a que altura do desfile fílmico Marcelo Mastroianni disse isso ou aquilo, onde moram os atores e atrizes, como vivem, quantas vezes e com quem se casaram, suas opções sexuais, boatos e mexericos que os rodeiam, em que produções atuaram e que prêmios arrebataram. Isto, contudo, não é conhecer o cinema se ignoram as estratégias narrativas adotadas por tal e qual diretor. Vou além: desconhecem o que acrescenta ou subtrai de uma cena ou de uma sequência o ângulo de gravação, e o significado que essa escolha dará ao entrecho fílmico em termos conteudísticos; o que uma panorâmica ou um travelling resulta em beleza e em sugestões no desenrolar da história. Têm do cinema um conhecimento enciclopédico, e são capazes de situar com segurança, por exemplo,  "Casablanca" e outros clássicos no quadro periodológico da sétima arte, mas desconhecem, mesmo assim, o que faz do cinema o que o cinema é: a mais prodigiosa de todas as artes, por trazer dentro dela os elementos constitutivos de todas as outras modalidades.

Não à toa, digo sempre, um filme é tanto maior quanto maior for o número de vezes que o vemos. Um detalhe da direção de arte, uma palavra no contexto de um diálogo, um corte intencionalmente 'impreciso' na perspectiva do que estabelece a gramática cinematográfica, o rigor técnico nos procedimentos de montagem ou a originalidade nas escolhas das estratégias narrativas adotadas, e a história de um filme pode ganhar nova força, novo relevo, novas potências discursivas, outra dimensão estética.

Muitas vezes, mesmo nos meios artísticos mais prestigiados, ouvem-se comentários infelizes sobre um dado filme, pela simples e importante razão de que a luz, a presença de um adereço sobre uma mesinha num canto de sala, o corte repentino à maneira de Glauber Rocha ou Jean-Luc Godard, a música de fundo ou um detalhe no vestido de uma atriz ---  coisas delicadas e quase imperceptíveis aos olhos desatentos do espectador comum ---, passaram despercebidos, ou não se soube, num exercício de abstração, tirar delas o seu real significado no desenrolar da história de um filme.

É do mesmo Caetano Veloso, no seu livro maravilhoso, o comentário que faço questão de reproduzir aqui: "... entre nós existe uma preguiça mental, um desleixo do intelecto que não deixa o povo ver um filme pensando. A nossa geração está acostumada a ver a obra fílmica de forma passiva, sensorial, quase irracional. Está viciada com os dramas coloridos e falsos de Hollywood, com os roxos dramalhões  mexicanos, com os rosados melodramas alemães e não pode entender Fellini".

Um filme, um livro, um espetáculo de teatro, uma instalação numa esquina de rua, a interpretação sentida e tecnicamente rigorosa de uma música, enfim, o que há nisso tudo em matéria de linguagem e apuro estético, são coisas muito grandes para passarem ao largo de nossa sensibilidade ou nossa atenção. Arte é entretenimento, sim, mas é muito mais que isso. A Arte deleita e ensina, liberta o homem dos monstros que habitam o seu interior mais profundo e mais sombrio, e, acima de tudo, como está em Dostoiévski, a Arte é a beleza que pode salvar o mundo.  

 

 

 

 

sexta-feira, 24 de maio de 2024

Os brutos também amam

Faz algum tempo, li no jornal Folha de S. Paulo uma crônica deliciosa de Ruy Castro sobre títulos, em português, de grandes clássicos da literatura mundial. Até tentei localizar o texto para citá-lo amiúde na minha crônica de hoje. Não o encontrei, o que não me impede, contudo, de tomá-lo como fio condutor do que vai a seguir.

Lido o texto memorável de Castro, ocorreu-me lembrar de como se deram, no mesmo filão, algumas traduções de títulos de filmes inesquecíveis do melhor Cinema para o Brasil. A coisa não chega às raias do surreal como se pode constatar em Portugal, onde, acreditem, "Animal Farm" (Fazenda de Animais), baseado no romance homônimo de Georg Orwell, ganhou o bizarro título de "O Porco Triunfante", assim, sem tirar nem pôr. Entre nós, para o bem ou para o mal, a tradução foi generosa, e o filme, a exemplo do que ocorrera  ao livro, recebeu o esquerdizante nome de "A Revolução dos Bichos". Tanto melhor.

Como bom bergmaniano, no entanto, ainda hoje reluto em aceitar o que fizeram ao belíssimo "Persona", o clássico de Ingmar Bergman que narra a história de Elizabeth (Liv Ullmann), uma atriz que perde a voz em meio a uma apresentação da tragédia "Electra" e passa a viver um conflito de identidade que leva o espectador a mergulhar nas zonas mais profundas da alma humana. O enredo, como se vê, tem mesmo uma relação estreita com o sentido do substantivo que serve de título ao filme. No Brasil, pasmem os menos familiarizados com a sétima arte, a obra estampou cartaz no mínimo estranho, já não fosse ridículo: "Quando Duas Mulheres Pecam". Arre.

Que dizer da película que imortalizou o inolvidável James Dean: "Rebel Without a Cause" (Rebelde Sem Causa), que resultou no apelativo "Juventude Transviada"? Vá lá, não é dos piores, e há quem diga que o título motivou Luiz Melodia a compor a bela música que entraria para o cancioneiro popular depois de embalar paixões adolescentes de minha geração. Tudo a ver, pois o filme explora a rebeldia de um jovem de família rica que resolve romper amarras e se envolver em confusões impensáveis.

Algumas traduções, faça-se justiça, tornaram filmes inesquecíveis mais reflexivos, mais metalinguísticos, explorando com sensibilidade o que existe na narrativa em termos de discussão do fazer cinematográfico. Parece-me ser o caso, por exemplo, do genial "Rear Window" (Janela dos Fundos), que nos trouxe Hitchcock elevado à máxima potência com o feliz título de "Janela Indiscreta". O filme conta a história de um homem que, impedido de sair de casa após um acidente, põe-se a bisbilhotar a vida dos vizinhos através da janela, até constatar, casualmente, a cena de um assassinato. Obra-prima.

Baseado no livro de Truman Capote, quem haverá de esquecer Audrey Hepburn, fascinante, na pele de Holly Golightly, em plena Times Square a tomar o café da manhã diante das vitrines da famosa Tiffany? É daí que nasceu o título do clássico "Breakfast at Tiffany's" (Café da Manhã na Tiffany), o mesmo do livro que lhe deu origem. Polêmico em suas sugestões extra diegéticas, guardamos na memória a doce história de "Bonequinha de Luxo". Neste caso, nada mal, e o escritor Ivan Lessa o considerava "estonteante". Idiossincrasias à parte, que belo filme. 

Do faroeste, vem-me à mente um filme que amo com o fervor de todo bom cinéfilo, e ainda posso ver o menino que fui sentado a uma cadeira do velho Cine Alvorada, em Iguatu, a roer as unhas diante da tela imensa: "Shane", é como se chama. Não há que ter tradução, pois o título remete à figura da personagem de Alan Ladd, protagonista de um clássico em que se pode perceber a síntese dos arranjos cinematográficos do gênero. Para se ter uma ideia do que afirmo aqui, dou a palavra a ninguém mais ninguém menos que Woody Allen: "É o meu filme favorito!". No Brasil... bem, no Brasil, é uma experiência incomunicável rever "Os Brutos Também Amam". O título, bem à maneira do que ocorreu à "Juventude Transviada", levaria Roberto Carlos a compor a música que se imortalizaria na voz de Agnaldo Timóteo. É verdade, os brutos também amam.

quinta-feira, 16 de maio de 2024

Jecas e Peris

Vira e mexe, leio ou ouço falar em "complexo do vira-latas". Muitas vezes, num vezo que é bem brasileiro, usa-se a expressão sem o pleno domínio do seu significado. Coisa da onda, um tipo de modismo que não raro leva o falante a dizer tolices. Mas, afinal, o que é esse "complexo" ordinariamente atribuído ao brasileiro? De que cabeça iluminada terá nascido a expressão? Corresponde ela, de fato, à realidade? Somos os brasileiros portadores desse desvio de personalidade? Vamos ao histórico da malsinada expressão.

Era 1958. A seleção brasileira viajara para a Suécia onde disputaria a Copa do Mundo de Futebol. Sua classificação fora sofrida: 1 a 0 sobre o Peru. O país ainda vivia o trauma da derrota em 1950, em pleno Maracanã, resultado que levaria os brasileiros a desacreditarem de suas possibilidades em tudo que exigisse deles a confiança da vitória. Se viesse, ela, a vitória, era atribuída à benevolência dos anjos e dos deuses, obra do acaso, filha do talvez ou do quem sabe. Menos por nossos méritos.

Em meio a essa descrença visceral, contrapondo-se ao que parecia ser mesmo um consenso, o dramaturgo, romancista, contista e cronista pernambucano, radicado no Rio de Janeiro, Nelson Rodrigues, profetizava o sucesso da canarinha em gramados europeus: "Eu acredito no brasileiro e pior do que isso: --- sou de um patriotismo inatural e agressivo".

Para ele, não nos faltavam craques, nem competência técnica, nem inventividade estratégica. Nosso problema, dizia, era não ter confiança em nós mesmos, e tremer diante de qualquer adversário que, à maneira de Obdulio Varela, o nosso algoz em 50, nos fizesse cara feia: "Qualquer jogador brasileiro, quando se desamarra de suas inibições e se põe em estado de graça, é algo de único em matéria de fantasia, de improvisação, de invenção --- temos dons em excesso".

Num lampejo de inspiração, coisa que jamais faltava a este exímio cronista (como dramaturgo é, hoje, quase uma unanimidade), referiu-se a esse sentimento de inferioridade, a essa incapacidade de agir com desassombro, a essa inépcia etc., com a expressão ainda hoje usada para definir um traço marcante da 'identidade' brasileira: Tínhamos o que chamou de "complexo de vira-latas".

Mas a coisa não é tão simples assim. Diante de qualquer sucesso, a exemplo do que ocorre cada vez que conquistamos uma Copa do Mundo, esse sentimento de inferioridade, essa descrença mórbida e paralisante, como se num passe de mágica, transforma-se num ufanismo desregrado e ingênuo, à maneira do Conde Celso, e nos sentimos imbatíveis, "Sansões" empoderados até a raiz dos cabelos. Cresce a nossa autoestima, agiganta-se o nosso amor-próprio, a nossa utopia sem limites.

Nelson Rodrigues, ele mesmo a nos exaltar após a conquista da Jules Rimet: "Já ninguém mais tem vergonha de sua condição nacional", afirma na crônica O Brasil em Campo, "e as moças nas ruas [...] andam pelas calçadas com um charme de Joana d'Arc. O povo não se julga mais um vira-lata. [...] O brasileiro tem de si mesmo uma nova imagem. Ele já se vê na generosa totalidade de suas imensas virtudes pessoais e humanas".

Para o bem ou para o mal, mais adequado seria falar-se de um "complexo do pêndulo", uma vez que nos é própria a ciclotimia inata, e, desde as origens mais remotas, estamos a balançar entre polos opostos, ora tocando o negativismo, ora a fé radiante; ora enlevados ao sabor das fantasias, ora mergulhados numa tristeza incurável. Mistura de Jeca Tatu e Peri, vamos cavalgando o dorso duro e escorregadio da História. Eis a nossa sina, até o sem-fim dos tempos.

 

quinta-feira, 9 de maio de 2024

Gosto se discute, sim

Do professor, vira e mexe, alguém quer saber: "Afinal, gosto se discute?" A questão, de aparência tão simples, exige cuidados, nomeadamente para quem, como eu, dedicou seus dias a falar prioritariamente da Arte.

Antes da resposta, precipitação a que me recuso lançar, formulo outra questão: "De que 'discussão' estamos falando?" É que o juízo de gosto (Kant), jamais pode ser visto como um juízo de valor. O mesmo se dá em contrário, ou seja, não posso atribuir a algo um valor tomando por base o meu gosto.

A estética kantiana é formulada não como uma dimensão objetiva, fisicalista, pautada pelo raciocínio lógico. A reflexão estética, para ele, passa por estados mentais, subjetivos, estando por isso voltada para as condições de receptibilidade, do prazer do sujeito.

Não me causa espécie, nem desmerece o meu interlocutor, quando diz: "Adoro a música sertaneja!" Vá lá, que goste e descubra na sua experiência estética algo que lhe dê prazer, que lhe faça ver naquele tipo de música a Beleza que é em si uma das funções da arte, ou melhor, que pode ser definida como a função estética da arte.

No entanto, se tomasse essa declaração do meu interlocutor como um juízo de valor, seriam outros quinhentos. Isso porque, com um mínimo de conhecimento musical, teria como evidenciar que a música de Tom Jobim, de Egberto Gismonti ou mesmo o violão de Raphael Rabello, exigem uma capacidade elaborativa, um senso estético, uma sensibilidade artística muito mais rebuscada, porque pautada pelo domínio do instrumental teórico.

É que não se pode confundir capacidade analítica com experiência estética. Eu amo a interpretação de Roberto Carlos (quase a perfeição), mas jamais incorrerei no erro de afirmá-lo maior do que Luciano Pavarotti.

Há quem afirme, e, bom bergmaniano, aceito: "Não gostei de Morangos Silvestres." Jamais acharia razoável, contudo, ouvir: "Este filme é ruim." Ao emitir seu juízo embasando-o no juízo de gosto, num tipo de subjetivação despretensiosa (o prazer desinteressado com que Kant define o Belo), e através dele atribuir ao filme um valor, o espectador incorreria num erro de análise, ignorando o que existe em Bergman de procedimentos cinematográficos de elevada qualidade estética: roteiro, montagem, escolha de planos, movimento e angulação de câmera, textura do fotograma, recursos de iluminação etc., além de mergulho na alma humana, de sondagem do conflito do homem a partir da memória. Gosto, nessa perspectiva, pode e deve ser discutido.

Como li há poucos dias num artigo sobre a crítica política, assinado por Wilson Gomes, da Universidade Federal da Bahia, "há coisas de que não gosto, mas que podem ser sublimes em seu gênero".

Diz ele: "O gosto e as preferências continuam sendo pessoais ou coletivas, mas as razões pelas quais gostamos, os programas executados em uma determinada obra, as soluções encontradas pelo realizador e sua originalidade, os padrões que orientam o que é considerado medíocre ou sublime, tudo isso é discutível". Perfeito.

Aliás, também em política, como em tudo na vida, gosto se discute (principalmente nela) quando trabalhamos com elementos, informações, histórico, provas cabais daquilo que está envolvido em nosso juízo.

Quando um lado abomina a democracia, o outro não; quando um lado faz a opção dos endinheirados, o outro não; quando um lado desconhece a necessidade de reparação para com negros e indígenas, o outro não; quando um lado exalta a tortura, o outro não; quando um lado é homofóbico, misantropo, o outro não; quando um lado propõe a volta de um regime autoritário, que prende, tortura, mata, o outro não etc., a discussão em torno do gosto ajuíza o meu "lugar de fala" como homem de esquerda, que considera muito ruim o que a extrema direita propõe.

Nesse caso, sem meias-palavras, afirmo: "Gosto, se discute, sim." E revela o homem.

 

 

   

sexta-feira, 3 de maio de 2024

Um carro, uma cama e uma reflexão

Uma caminhonete com placa oficial passa pela avenida transportando uma cama. Com o celular, alguém faz um vídeo da ocorrência, envia para uma redação de tevê e em poucos minutos as imagens aparecem no noticiário. Ato contínuo, o governador assina a exoneração de quem responde pela instituição a que pertence o veículo. A matéria é reproduzida à exaustão nas redes sociais. Nenhuma palavra que indique a apuração do fato, tampouco o direito de o acusado esclarecer o que realmente houve. Como, se apareceu na tevê?

O fato a que me refiro ocorreu esta semana em Fortaleza. A pessoa responsabilizada, a quem não foi dado o direito de se explicar, tem nome: Aderilo Antunes de Alcântara Filho. Foi vereador de Iguatu por pelo menos cinco mandatos. Foi vice-prefeito e prefeito da cidade. Conheço-o de perto, e fui vereador na mesma época que ele por dois mandatos. Trilhamos sempre caminhos políticos opostos, mas nos respeitamos e invariavelmente foram cordiais as nossas relações.

Vivemos um tempo de julgamentos apressados. Uma simples foto de celular, um vídeo realizado precariamente, e podem estar sendo destruídas reputações, histórias, trajetórias, sob o peso implacável do imediatismo por que orientamos nossas interpretações da realidade. O direito de defesa, a oportunidade de se fazerem esclarecimentos e de se dirimirem dúvidas, vêm depois. Por mais convincentes e condizentes com a verdade, terão, no entanto, pouca serventia. A imagem que fica é a da acusação, salvo raríssimas situações. A imagem da pessoa nunca será a mesma.

Por dever de justiça para com o senhor Aderilo Antunes de Alcântara Filho, fui a público, nos limites estreitos do meu alcance para formar opinião, mesmo para os meus conterrâneos de Iguatu, não para defendê-lo, mas para dizer que o conhecia, e que me incomodava terrivelmente vê-lo exposto à execração de muitos sem que pudesse esclarecer o fato, apontar justificativas ou mesmo desculpar-se pelo erro cometido. Quem nunca errou um dia?

De que vale uma história, de que vale o trabalho que pude acompanhar de perto em favor de sua gente, a liderança construída com suor e luta, a família merecedora de respeito, seus filhos, sua mulher, de que valem diante de um vídeo em que se vê uma caminhonete transportando uma cama?

Por outros canais, e-mail e whatsapp, sobretudo, recebi a propósito do meu comentário, envolvendo a figura pública do senhor Aderilo Antunes de Alcântara Filho, um sem-número de mensagens discordando do que pareceu a muitos, de minha parte, uma defesa irredutível do ex-prefeito de Iguatu, a quem não vejo há muitos e muitos anos.

Não o fiz. Única e tão-somente me manifestei contra a punição açodada infligida a uma figura pública de quem, ausente da cidade de Iguatu há pelo menos duas décadas, guardo ainda as boas lembranças: a do homem cordato, afeito, como disse, a servir à comunidade.

Mas a política é mesmo dinâmica, uma vez que muitas das críticas feitas hoje a Alcântara, partiram de antigos companheiros seus de vida pública. É que políticos, com raríssimas exceções, são assim mesmo: vão e vêm ao sabor dos ventos, das conveniências e das benesses. Quanto a mim, cabe evidenciar, insisto, que Aderilo Filho e eu militamos sempre em lados políticos opostos, o que não é bastante para vê-lo como inimigo, emitindo sobre sua pessoa julgamentos que firam a minha consciência. Se errou, como dizem haver evidências, deve pagar por seu erro, mas não é justo que lhe seja negado o direito de defender-se.

No filme "Rashomon" (1950), de Akira Kurosawa, para um mesmo crime (um estupro seguido de morte), quatro testemunhas, inclusive o próprio morto, contam quatro versões diferentes. Ao final, com a beleza estética de um gênio da arte de filmar, a única luz da verdade que se pode vislumbrar, é que entre as diferentes formas de enxergar as coisas, "a vida sempre acha uma maneira de prevalecer, e nós de nos solidarizarmos com ela".

Enquanto não restarem esclarecidos os fatos (expostos à larga nas redes sociais e num canal de tevê, num tipo de humilhação que condeno), na linha do que sempre fiz, me manifestarei contra juízos apressados que resultem na destruição de reputações e da imagem de pessoas.

A política entre os iguatuenses não pode continuar assim. Está feito o registro.