Nos limites do estado, ou mesmo fora dele, não será fácil encontrar um homem com a densidade humana de Pedro Normando Feitosa. Digo isso, assim, sem meias-palavras, porque tenho a convicção do que isso representa, num tempo em que estamos tão carentes de nomes valorosos como ele foi, como pessoa e como profissional.
Conheci-o, mais inteiramente, como colega de trabalho, assim que ingressou como professor, poucos anos depois de mim, e logo engajou-se nas lutas pela redemocratização da então Escola Agrotécnica Federal de Iguatu, passando, em questão de dias, a fazer parte de uma geração que despontava no cenário da educação profissionalizante federal como uma alternativa para o modelo vigente desde o Golpe de 1964, com a antiga COAGRI.
Eram tempos difíceis, autoritários, muito embora, em nível da EAFI, contássemos com gestores mais arejados e afeitos ao diálogo, a exemplo do que foram, enquanto diretores, Elze Montenegro e Pedro Hiromasa Osawa, com quem sempre tivemos relações cordiais, na perspectiva pessoal e profissional. Mas, insisto, eram tempos difíceis, quando a educação profissionalizante no país encontrava-se umbilicalmente ligada aos ditames do famigerado acordo MEC-USAID. Um horror.
Pois bem, desde os primeiros dias como contratado da Escola, Pedro Normando tornou-se uma liderança inconteste, sobrepujando os da linha mais combativa, comprometida ideologicamente com um projeto de esquerda, de que eu fazia parte, por seu perfil conciliador e aberto ao diálogo com que se tornaria, em pouco tempo, um elemento catalisador das diferentes frentes de militância que defendiam um projeto de transformação do modelo de gestão até então adotado.
Com sua desenvoltura política, no que inequivocamente guardava algumas características mais conservadoras, Normando foi ocupando espaços, negociando, com um talento insuspeito, propostas e linhas de ação; conversando com adversários, apontando saídas para as questões mais polêmicas, adoçando o debate com um jeito inconfundível de tratar com as diferenças e o contraditório. Enfim, fazendo como sabem fazer as grandes lideranças a fim de obter os bons resultados, mesmo quando, não raro, tornam-se alvo de julgamentos precipitados e de incompreensões muitas vezes injustas.
Tornou-se diretor "pró-tempore", mostrou trabalho, ganhou adeptos, convenceu descrentes, indicou caminhos e soluções, fez e refez, liderou radicais e conciliadores, suplantou barreiras, venceu desafios, agigantou-se como um nome imbatível nas eleições para Diretor-Geral da Escola Agrotécnica Federal de Iguatu. Venceu, elaborou um projeto de gestão moderno, sintonizado com o que existia de mais avançado em termos de educação técnica no país --- e elevou a EAFI a uma posição de destaque na rede em nível nacional, de que se tornaria, ele, Normando, uma das vozes mais respeitadas e ouvidas de todos os tempos.
Mas é da pessoa humana que gostaria de falar, dedicando-lhe, exatamente como o escrevi no momento em que fui comunicado de sua morte, sob o peso de uma incontida emoção, este pequeno e mal traçado poema em prosa, Pleonasmo para Normando: "Amigo, irmão de tantas estradas, de tantas lutas... de tantas utopias! Meu irmão querido, das vezes em que concordávamos e, muito mais, amigo das dissidências, não raras! Amigo e irmão Normando, das viagens juntos, de tantas conquistas, das tardes de conversas jogadas fora! Meu amigo, meu irmão, meu companheiro de batalhas, meu confidente nas horas de aflição e medo do desconhecido, que ainda sinto a força da tua mão amiga, quando dos passos inseguros, dos titubeios inomináveis da vida! Meu patrono de ECC, meu desafeto das ideologias, meu eterno parceiro das tardes de sexta-feira, da cerveja gelada, do queijo assado na varanda de tua casa, do cigarro ruim, do falso amigo que mata! Meu Diretor, meu amigo, meu querido companheiro de voos, meu vizinho de quarto nos hotéis, meu incansável lutador, meu chefe, meu querido Normando... Meu admirável sonhador, meu exemplo de fidalguia, meu bom conterrâneo, meu eterno conselheiro! Meu insubstituível professor das melhores lições: deixa que te diga, insisto, que te tente dizer, agora que não escutas (a voz embargada pela notícia que dói, que me abre o peito), que vamos, meu ídolo e de todos nós, que haveremos, assim repetindo palavras e juras, eu e os de tua equipe dos tempos de Escola, te amar sempre, apesar da tua ausência e da falta imensa que fazes! Te amar e encontrar formas de continuar a tua luta, teus planos que ficaram por realizar, teus inumeráveis projetos, tua maneira sem par de acreditar na vida e nos homens! Deixa, por Deus, deixa que te agradeça por tudo, meu amigo e meu irmão Normando... grande, imenso cidadão, deixa que te dê um último abraço e que me espelhe no teu exemplo, na tua dignidade e na tua retidão! Para sempre, deixa!, que ainda existe --- pela frente ---, um caminho de pó e de esperança!
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