quinta-feira, 17 de junho de 2010

As mulheres do Louvre

QUEM AINDA NÃO ouviu falar das belas mulheres do Louvre? Pois bem, são famosas as musas que constituem uma porção especialmente atraente deste grande museu de Paris.

A Vitória de Samotrácia, de autoria desconhecida, ocupa um lugar especial no topo de uma escadaria do suntuoso prédio. A sua realização remonta, supostamente, a 190 ou 200 anos a.C. Seria provavelmente a ponta esculpida de uma proa de navio, ou, como querem alguns historiadores, um ex-voto dedicado a uma conquista ou a uma batalha vencida. Não importa, tanto, saber. O que parece consensual, é que a peça constitui um símbolo da vitória humana sobre o desconhecido. Sem cabeça e braços, a escultura avulta, solene e sedutora, entre as muitas mulheres do Louvre.

Havia pouco topara com a Vênus de Milo, com o sortilégio de sua nudez, despertando, em gregos e troianos, um tipo de iconolagonia ante a sensualidade clássica que emana do mármore. Representa Afrodite, a deusa grega do amor e da beleza, chamada de Vênus entre os romanos. Diante da estátua, curvara-me sobre o ombro da namorada para comentar a nudez ambiguamente contida e provocadora da deusa. Lembrei-lhe, na oportunidade, que Heine, Henri Heine, o famigerado poeta alemão, chamava-a de Nossa Senhora da Beleza.

Pouco depois, outra mulher deslumbrante, a jovem 'Liberdade' guiando o povo, de Délacroix, sobre cuja tela falei anteriormente nestas memórias. Assim, aqui e além, cada uma com sua magia e seu encantamento, carregadas de simbologias e sugestões, veem-se no Louvre essas maravilhosas mulheres, musas inspiradoras dos grandes nomes da Arte Ocidental.

Mas nada comparável à pintura de Lisa Gherardini, a poderosa mulher do florentino Francesco di Bartolomeo di Zanoli del Giocondo. Ou, simplesmente, a Mona Lisa, mais alta representação do Alto Renascimento e do gênio de Leonardo di Piero da Vinci.

A uma distância de oito ou dez metros, deparo com uma multidão de turistas diante da tela de proporções pequenas e importância gigantesca de Leonardo da Vinci. Agora (fato que se repetirá nas outras vezes que iria ao Louvre, anos depois), veem-se pessoas tomadas de uma emoção intensa e incontida, não raro em prantos, como não acreditando estarem ali, a poucos passos da mais aurática, a mais esplendorosa obra do cânone artístico ocidental.

Com o seu sorriso indecifrável, na expressão de um olhar a um tempo esnobe e simples, a figura intraduzível, penetrante e sedutoramente serena da mais conhecida mulher de todos os tempos. A Gioconda, sobre quem dirá o poeta Carlos Drummond de Andrade: "O ardiloso sorriso / alonga-se em silêncio / para contemporâneos e pósteros, / ansiosos, em vão, por decifrá-lo. / Não há decifração. Há o sorriso."

Enigmáticas, intangíveis, sedutoras, obscuras, inexplicáveis, cheias de mistério e encanto, fortes e sensuais, firmes e decididas, como foram por certo aquelas que lhes serviram de modelo, as mulheres do Louvre são um espetáculo à parte. Inspiradoras e veladamente soberbas, como todas as mulheres, através dos tempos e das civilizações.

2 comentários:

  1. Fantástico o texto. Parabéns!

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  2. Vamos remontar "A Morta" e quando li o seu texto, logo lembrei do "Poeta" de Oswald de Andrade que define minha pesonagem "Beatriz":

    "És sempre uma Vitória de Samotrácia, com os olhos e os cabelos presos a um horizonte sem fundo."

    Um abraço.

    Lu!

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