Se não me engano, está num dos livros de Erwin Panofsky o fato a que me reporto: já idoso e adoentado, o filósofo Immanuel Kant recebe a visita do seu médico. Como insistisse em ficar de pé, seu visitante compreendeu que ele não se sentaria até que a visita o fizesse primeiro. Só então Kant ocupou um assento e murmurou as seguintes palavras: - "O senso de humanidade ainda não me deixou". Embora a palavra humanitä tivesse à época, no século XVIII, o sentido de polidez, civilidade, o filósofo por certo a usara com o significado mais profundo que o termo possui, algo como a trágica e orgulhosa consciência dos princípios humanos mais nobres, mais elevados, mesmo quando o tempo já impôs ao homem suas marcas naturais.
O fato me veio à mente tão-logo concluí, como que encantado, a leitura do maravilhoso Iguatu, pelos novos caminhos da História, com que Wilson Holanda Lima Verde presta mais um inavaliável serviço à inteligência de nossa terra. Com uma bem cuidada edição, confiada à Expressão Gráfica Editora, o livro é um apanhado expressivo de alguns dos fatos mais marcantes da história de Iguatu, com farta referência a muitos dos filhos ilustres do município, entre os quais, num gesto de pura cordialidade do autor, figura o meu nome ao lado de personalidades realmente importantes da nossa vida intelectual, social, econômica e política.
De expoentes da música popular brasileira, como Evaldo Gouveia e Humberto Teixeira, ou erudita, como Eleazar de Carvalho, passando por talentos do teatro e do cinema, como Pedro Lima Verde, ou da filosofia, como Alcântara Nogueira, a políticos atuantes como Elmo Moreno, Roberto Costa e Hildernando Bezerra, sem esquecer mitos como Adahil Barreto Cavalcante e Manuel Carlos de Gouvêa, todos filhos de Iguatu, a pesquisa ora publicada em livro por Wilson Lima Verde constitui relevante contribuição para o resgate da nossa memória histórica, não raras vezes negligenciada pelas autoridades constituídas.
Na linha do que professara Ortega y Gasset, para quem "a história é a realidade do homem, outra não há, e negar o passado é absurdo e ilusório, porque o passado é o natural do homem que volta a galope", na defesa de um princípio de humanidade a que me refiro acima, o livro Iguatu, pelos novos caminhos da História, de Wilson Holanda Lima Verde, já nasce clássico, alargando o cânone inaugurado por Alcântara Nogueira com Iguatu -- e há pouco enriquecido com importante pesquisa de seu primo José Hilton Montenegro acerca da linha férrea.
Para não falar do estilo, elegante, enxuto, escorreito com que tece o seu texto inconfundível. Em tempo, reclamo do historiador não ter, a respeito deste colunista, acrescentado uma informação relevante: de que lhe devo muito pelo incentivo e pelo exemplo de amor aos livros, em que tanto mirei.
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