sábado, 16 de julho de 2011

Meia-noite em Paris

Fui com o Saulo ver Meia-noite em Paris. Wood Allen reedita seus melhores momentos, bem na linha do realismo mágico de A rosa púrpura do Cairo (1985) e Neblinas e sombras (1991), dois dos seus filmes de que mais gosto. O melhor, para este humilde cinéfilo, continua sendo Interiores. Mas aí são outros quinhentos, coisa de todo bergmaniano que se preza. Voltemos a Paris.

Pois bem. Um amigo francês de gosto apurado não falara bem do filme e fui ao cinema meio sem graça. Qual não foi a minha surpresa: Allen volta, na minha opinião, aos seus melhores momentos. Trata-se de uma comédia com pitadas de drama extremamente engenhosa. Imagine um roteirista de tevê -- com vaga inclinação para a grande literatura -- poder voltar a Paris dos anos 20 e passar a conviver intimamente (e por obra do acaso) com monstros sagrados da Arte, como Picasso, F. Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, Cole Porter, e Luis Buñuel. É o que acontece com americano Gil, que visita com a mulher, Inez (Rachel McAdams), e a família dela, a capital francesa, onde pretende morar por uns tempos, sob os ares inspiradores da cidade em plena Belle Époque.

O filme realiza de um plano a outro a viagem deslumbrante a essa cidade diferenciada, entre outras razões, por ser o exemplo mais convincente de que modernidade não quer dizer destruição do antigo em favor do novo. Eis a razão por que Allen fez um filme relativamente barato, uma vez que o cenário é o mesmo para momentos históricos tão diferentes, sobremaneira nas locações onde se veem aqueles espaços mágicos por onde transitaram alguns dos maiores gênios da pintura, da literatura, da música e do cinema, na sequência dos nomes citados acima. Nenhuma outra cidade possibilitaria ao cineasta americano ir de um tempo a outro num piscar de olhos e ter 'prontinho' para a ambientação das cenas este cenário deslumbrante que é Paris, sobremaneira à noite, quando a narrativa desfila por quase todo o longa-metragem.

O texto é fantástico, a direção dispensa comentário e o desempenho dos atores, mesmo dando-se algum desconto à ponta reservada à senhora Sarcozy, Carla Bruni, é notável. É aí que Marion Cotillard rouba a cena na pele de Adriana, uma estudante de alta costura que namora Picasso. Sua atuação sobressai pelo absoluto domínio do papel e pela naturalidade com que dá realce à sensualidade estonteante de que é possuidora.

Para não falar da beleza sem igual da cidade. As tomadas de Montmartre à noite, sob uma chuva que só realça o magnetismo romântico que a cidade encerra, são de uma plasticidade indizível. É ir ao cinema ou esperar que o último Wood Allen saia em DVD, o que está anunciado para as próximas semanas. Nada que se compare, no entanto, àquelas imagens inesquecíveis que só a tela grande é capaz de mostrar com absoluta exatidão. Um belo filme.






2 comentários:

  1. Meu querido amigo e escritor. Apraz-me ler, e muito, suas crônicas,. Pelo seu talento, como você discorre com falicidade sobre seus temas. Coisas de quem sabe fazer.
    Permita-me, com muita humildade, uma observação: gosto mais quando você escreve sobre aquilo que você sente e cria. Discorrer sobre filmes, tema que você domina muito bem, talvez lhe deixe derrapando no óbvio dos críticos de cinema ( refiro-me só aos nacionais), a serviço de quem quer vender o produto. Quando você analisa um filme, Assim o faz com propriedade de quem entende e não como um mero (desculpe a expressão) vendedor.
    Quero crer que, nesse coração de cronista e de poeta apaixonado, aos borbotões sairão outros belos textos, de ternura e paixão, embalando as horas de quem se deleita em lê-los. UM grande e afetuoso abraço do seu fã. Perdão se fui indelicado.

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  2. Prezado leitor e amigo: Li atentamente seu comentário. Agradeço-lhe pela sugestão. O fato de escrever sobre cinema prende-se a uma das minhas paixões, desde menino. Agora, por último, desenvolvo pesquisa nessa área, mais precisamente sobre Bergman, o que, supostamente, tem me trazido com mais frequência para o campo da estética fílmica.Mas não abandonarei o tema do amor, acredite. Grande abraço!

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