Tenho por praxe não escrever sobre aquilo que desconheço. É um princípio básico de correção intelectual, razão por que começo a coluna de hoje evidenciando: ainda não assisti ao filme A vida de Adèle, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes. Mas, pelo que pude ler sobre o longa de Abdellatif Kechiche, causará polêmica ao chegar aos cinemas brasileiros. É que o filme, que gira em torno de uma paixão envolvendo duas jovens adolescentes, traz (na opinião dos críticos a que tive acesso) cenas de sexo como poucas vezes se pôde ver no cinema.
Pois bem. Li os comentários e falei aos botões: Ora, o que está em questão não é o fato de aparecerem no filme cenas de sexo, assim, explícitas; mas o fato de tais cenas mostrarem um caso de homossexualismo num momento em que o debate sobre a sua legitimidade vem à tona de maneira mais definitiva, a exemplo da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. A propósito, não é muito lembrar que a premiação de A vida de Adèle ocorre, coincidentemente (ou por isso mesmo), quando as manifestações contra a aprovação da lei tomam conta das ruas de Paris.
Do ponto de vista meramente artístico, aliás, nada de novo. Quem não se lembra, em tempos recentes, da fortíssima sequência em que Natalie Portman e Mila Kunis transam no belíssimo O Cisne Negro, de Darren Aronofsky? Ou, entre os mais atentos à história do cinema, do inquietante O Império do Sentidos, de Nagisa Oshima, igualmente premiado no Festival de Cannes, lá por volta de 1976? Para não falar de tantos e tantos outros títulos que me ocorrem no momento em que paro para escrever esta crônica. Calígula, do italiano Tinto Brass, por exemplo?
Chega de falsos pruridos, quando se tem no Brasil, para não esquecer, a programação da TV Globo, com suas novelas perpassadas de cenas não menos ousadas em termos de estetização do sexo. O que deve sustentar o debate é a dimensão artística do trabalho. Até que ponto, de fato, se trata de imagens indispensáveis ou que acrescentam elementos estéticos importantes ao filme? É justo, neste contexto, insistir demarcando territórios entre o que é e o que não é a arte? Faz sentido estabelecer "taxonomias" diante do que, sendo expressão do humano, requer a condição de arte?
"Lembrando", como diriam os repórteres das tevês cearenses, num vício entre irritante e chulo, que Gilles Deleuze, no polêmico Cinema I - Imagem Movimento, já observara com correção: "... o cinema não copia ou reproduz a realidade. O cinema expressa a realidade" (cito de memória). Assim sendo, ansioso por assistir ao filme do franco-argelino Abdellatif Kechiche, ouso considerar que dele, como quis o presidente da comissão julgadora deste ano, Steven Spielberg, em Cannes, deve-se esperar o que de bonito traz sobre o amor, sem a coceira do preconceito em torno do que é "diferente". Quando menos em termos artísticos, é saudável que se pense assim. Para o bem do cinema.
Pois bem. Li os comentários e falei aos botões: Ora, o que está em questão não é o fato de aparecerem no filme cenas de sexo, assim, explícitas; mas o fato de tais cenas mostrarem um caso de homossexualismo num momento em que o debate sobre a sua legitimidade vem à tona de maneira mais definitiva, a exemplo da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. A propósito, não é muito lembrar que a premiação de A vida de Adèle ocorre, coincidentemente (ou por isso mesmo), quando as manifestações contra a aprovação da lei tomam conta das ruas de Paris.
Do ponto de vista meramente artístico, aliás, nada de novo. Quem não se lembra, em tempos recentes, da fortíssima sequência em que Natalie Portman e Mila Kunis transam no belíssimo O Cisne Negro, de Darren Aronofsky? Ou, entre os mais atentos à história do cinema, do inquietante O Império do Sentidos, de Nagisa Oshima, igualmente premiado no Festival de Cannes, lá por volta de 1976? Para não falar de tantos e tantos outros títulos que me ocorrem no momento em que paro para escrever esta crônica. Calígula, do italiano Tinto Brass, por exemplo?
Chega de falsos pruridos, quando se tem no Brasil, para não esquecer, a programação da TV Globo, com suas novelas perpassadas de cenas não menos ousadas em termos de estetização do sexo. O que deve sustentar o debate é a dimensão artística do trabalho. Até que ponto, de fato, se trata de imagens indispensáveis ou que acrescentam elementos estéticos importantes ao filme? É justo, neste contexto, insistir demarcando territórios entre o que é e o que não é a arte? Faz sentido estabelecer "taxonomias" diante do que, sendo expressão do humano, requer a condição de arte?
"Lembrando", como diriam os repórteres das tevês cearenses, num vício entre irritante e chulo, que Gilles Deleuze, no polêmico Cinema I - Imagem Movimento, já observara com correção: "... o cinema não copia ou reproduz a realidade. O cinema expressa a realidade" (cito de memória). Assim sendo, ansioso por assistir ao filme do franco-argelino Abdellatif Kechiche, ouso considerar que dele, como quis o presidente da comissão julgadora deste ano, Steven Spielberg, em Cannes, deve-se esperar o que de bonito traz sobre o amor, sem a coceira do preconceito em torno do que é "diferente". Quando menos em termos artísticos, é saudável que se pense assim. Para o bem do cinema.