sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Humberto Teixeira há 40 anos

Do poeta e companheiro da Academia Cearense de Cinema, Barros Alves, chega-me às mãos, na íntegra, o depoimento do compositor Humberto Teixeira para o Museu Cearense da Comunicação. O material, publicado há alguns anos pelo Banco do Nordeste, resulta de uma entrevista realizada por Nirez com o iguatuense ilustre em 1977, preciosa oportunidade de conhecer, pela voz do próprio Humberto, vida e obra de um dos mais importantes artistas do Ceará, hoje, infelizmente, um tanto esquecido até mesmo de seus conterrâneos de Iguatu. Pela data redonda, quarenta anos, tomo a liberdade de reproduzir aqui alguns fragmentos do longo depoimento. 

Indagado sobre o nome completo, diz ele: -- "Humberto Cavalcanti, com 'I' (risos), de Albuquerque Teixeira". E, reportando-se ao fato de adotar o nome artístico Humberto Teixeira, acrescenta: "[...] o fato de eu usar só Humberto Teixeira criou, de certa forma, um problema dentro da minha casa, porque minha mãe é muito ciosa do Cavalcanti, ela é Cavalcante de Albuquerque, [...] ela não entende bem porque eu não uso o meu nome completo, Humberto Cavalcanti de Albuquerque Teixeira". 

Sobre o início de sua vida escolar, comenta: -- "Estudei as primeiras letras em Iguatu mesmo, primeiro em casa, depois num colégio que tinha lá, o colégio do doutor Rolim. [...] Era um colégio modesto, não só nas suas instalações como no seu professorado, de maneira que em pouco tempo eu senti ou meus pais sentiram a necessidade de me mandar para Fortaleza, onde eu vim continuar meus estudos".

Em seguida, discorre sobre como viu despertar o interesse para a música: -- "[...] um dia, eu devia ter cinco anos, meu pai me levou para Iguatu um instrumento estranho que ele comprou em Fortaleza, que era uma espécie de gaita, mas tinha um teclado de acordeom, um instrumento que eu procurei tanto e até hoje procuro e nunca mais vi... [...] eu tirei dela as minhas primeiras músicas, canções, modinhas e depois, já aí, eu comecei a fazer as minhas próprias modinhas". 

Quase menino, pois, Humberto compôs muitas músicas, mas, como afirma, mostrava-se tímido em revelar a autoria dos seus primeiros trabalhos: -- "[...] um dia, com o maestro Antônio Moreira, eu cheguei para ele usando um artifício: 'olha, maestro, eu encontrei lá nos alfarrábios da minha mãe uma valsa antiga...' Ele disse: 'Olha Humberto, vamos deixar essa história de alfarrábios de sua mãe e tal, isso aí é um negócio que você fez, não é?'" 

Cita o seu primeiro sucesso em música: -- "[...] meu primeiro sucesso em disco [...] foi a minha primeira gravação, Sinfonia do Café". 

Recorda como conheceu Lauro Maia: -- "Lauro Maia eu conheci no Rio de Janeiro. E, engraçado, eu não o conhecia do Ceará. [...] naquela época ele namorava a minha irmã Djanira, e só depois eles foram para o Rio e, claro, nessa ocasião, é que eu fui apresentado a Lauro Maia". "Com ele, diz, compôs Terra da Luz, [...] a primeira manifestação musical da minha saudade do Estado de onde, de longe...". 

Sobre a parceria mais famosa, com Luiz Gonzaga, relembra: -- "O Luiz Gonzaga, tal como eu, como o Lauro, ele estava fazendo os primeiros sucessos com Mula Preta, O Chamego, algumas músicas ele fazia com Miguel Lima, mas era para lançar realmente música do Norte, ele não dizia do Nordeste... Ele procurou o Lauro [Maia] e o Lauro disse: 'Olha, procura o meu cunhado, o Humberto Teixeira. Ele também é compositor e faz música do Norte, tudo isso, ele é mais organizado...". 

Detalha como surgiu o baião, gênero de estética musical criada por Humberto e Luiz Gonzaga: -- "[...] Depois de sucessos como Juazeiro, Pé de Serra e Xanduzinha, uma série de músicas que eu tenho gravado com Luiz, ele [Lauro Maia] disse assim, 'mas puxa, depois dum negócio desse, vem cantar moda de igreja de cego aqui!?' Mal sabiam eles (sic) que nós estávamos gravando ali uma das páginas mais maravilhosas". A fala de Humberto é retorcida e dá margem a interpretações divergentes, mas pode-se concluir com certa segurança que se refere à gravação de Asa Branca

Mais adiante, identifica o ritmo a partir da música Baião: "Eu vou mostrar pra você/Como se dança o baião/Pois quem quiser aprender...". 

Nega ter qualquer vocação política, embora, como deputado federal tenha aprovado leis importantes para o mundo artístico brasileiro. E justifica a sua incompatibilidade com os valores da atividade político-partidária: -- "Cuidei também das coisas do Ceará, diga-se de passagem, mas nunca fui político não, viu? [...] é um negócio que não se adapta muito à minha [vocação]... é um negócio que você tem que usar de muitas éticas (sic), e a minha ética é uma só, ela é muito indiscutível. De maneira que eu sou um artista, e um artista íntegro, graças a Deus, e que cuido muito das minhas coisas". 

E se mostra ressentido com o Ceará, que quis dele o que nunca se propôs fazer enquanto político: -- "Eu, para ser franco, eu às vezes (ri), lá à distância, eu tinha assim uma magoazinha do meu estado. Eu não deixei transparecer isso em música. Eu acho que cada uma serve a seu estado da forma como vive, por intermédio da profissão que professa, por intermédio da missão que missiona, por intermédio, enfim, de suas atividades. [...] Eu não podia trazer construção para o meu estado, eu não podia carregar para o meu estado determinadas benesses que não estavam ao meu alcance fazer. Mas eu cantei e decantei o meu estado através daquilo que eu sei fazer, que é música". 

A mágoa, diz ele, não é menor de Iguatu, mas não esclarece por quê: -- "[...] se eu puder conciliar as datas... [refere-se aos seus muitos compromissos pelo país], e eu voltando, então vou rever minha terra. Se eu tinha uma certa magoazinha do Ceará, da minha terra, então, você nem queira saber". 

Humberto Teixeira morreria pouco tempo depois sem voltar a Iguatu, onde estivera por ocasião do centenário da cidade e, pela última vez, quando da campanha para deputado. Entre as muitas fotos que constam do livro, muitas têm Iguatu como cenário, aparecendo em algumas delas com Dr. Gouvêia e Dr. Agenor Gomes de Araújo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

    

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