sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Seria roubar-me de mim

Para Érica Stolf, com carinho

Leitora envia-me por e-mail um desses textos que abundam na internet. Texto bonito, com um verniz poético pouco original mas de certo modo tocante. Falo da forma, uma vez que o conteúdo professa uma visão da felicidade como algo que independe do outro, numa perspectiva egocêntrica que se contrapõe à minha concepção de felicidade, sempre associada a fazer o outro feliz. Está claro, presumo, que me refiro à felicidade amorosa, relacional. Neste caso, penso que a felicidade consiste em saber fazer o outro feliz, o que pressupõe reciprocidade na construção dos sonhos, dos projetos, da realização por que se devem orientar aqueles que amam.

Ademais, o viés pelo qual o autor ou autora do texto tece a sua concepção da felicidade interior, parece ignorar a energia que move sobretudo o homem na busca de suas realizações. Estou falando do olhar masculino, e da forma como ele, o homem, busca a superação de suas dificuldades e a conquista de novas 'realidades' no amor. Fui a Pascal para reacender na memória uma de suas reflexões mais sábias: - "Toda a infelicidade dos homens vem de uma só coisa, que é não saberem ficar quietos dentro de um quarto."

Está numa das seções dos 'Pensamentos', mais precisamente na parte da obra em que Pascal faz uma reflexão sobre o divertimento, aqui entendido como a busca da felicidade pelo homem. Esta felicidade vai de encontro à felicidade silenciosa e individualista de que fala o e-mail da leitora, uma concepção, reconheço, mais refinada e vazada em princípios mais sábios.

O amor, aliás, é uma das buscas que o pensador condena, pois através delas o homem, quando ama, vive uma experiência de perda de si mesmo, o que, no meu caso particularmente, equivale a correr riscos, a lutar contra o desconhecido, ignorando que o amor é quase sempre transitório e fugaz. Daí, percebe-se, advém a trágica transformação da ventura em desventura, matéria em que tenho me especializado através desses muitos anos. E do que não me arrependo. Vou em frente.

Os românticos são assim, razão por que suas histórias são extremamente ricas, dolorosas, mas inesquecíveis; mal resolvidas, mas empolgantes, o que basta para encher seus corações, apesar das desilusões e da dor recorrentes em suas eternas viagens de descoberta. A figura do homem romântico, intranquilo, sem muito jeito para lidar com a solidão e vencer as travessias, se por um lado maltrata, por outro enriquece o repertório de experiências com que constroi a sua vida e a torna interessante. Enfim, amiga leitora, seu e-mail é pujante de sabedoria, pelo que expresso aqui a minha gratidão. Mas não poderia, uma vez que fosse, faltar com a minha necessidade de transparência e honestidade em tudo que faço. Acho que o meu lado 'feminino' e ocidental anda cada vez mais vivo em mim. A felicidade como é concebida no seu e-mail tem um cheiro oriental que não me agrada. Ainda.



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