sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O livro é que nem mulher

A minha relação com o livro tem um componente passional, não nego. Começa com um flerte, à distância, quase sempre na vitrine da loja.

Como em se tratando das mulheres, me chama a atenção a forma como se vestem. Adoro as discretas, que sabem com aparente desleixo compor o traje, combinando bem a textura dos tecidos com a expressividade das cores. As que exibem sua beleza com discrição e muito charme. As que sugerem displicência e, no entanto, estão ali, antenadíssimas, e que tudo sabem. Enciclopédicas.

No caso deles, os livros, há os que, já de longe, impressionam pela encadernação, o look da capa, o colorido da gravura - quando têm gravura -, a elegância e a simplicidade como se apresentam, sem afetação.

Assim, é comum que me aproxime desse como de uma mulher, meio maroto, como quem quer e não quer. Mas, de perto, a gente checa o volume do corpo, a maciez da pele, e, importante!, quais as intenções com que veio a público.

Curioso: logo se estabelece a comunicação. Entre intimidados e desejosos, aproximamo-nos, um tanto sorrateiros.

Aí vem a primeira troca de informações, a primeira sugestão de intimidade; a mão no dorso ligeiramente arredondado, nunca esquelético, e gostoso de se pegar.

Em seguida, a entrega. Os primeiros afagos, os toques sutis e o cheiro bom, que provoca aquele gostoso arrepio de pelos. E a gente vai tendo uma vontade de levar pra casa, de ficar horas e horas no bem bom, agarradinhos e afáveis. Quase sempre, na cama.

Mas há que se tomar cuidado, posto que existem os enganosos, os que vendem gato por lebre e estão pessimamente intencionados.

Há os surpreendentes, os que decepcionam, os vulgares, os indecentes. Os passageiros.

Há os muito rebuscados, os artificiosos, os superficiais.

Há os tímidos, que vão se revelando aos poucos. A esses, deve-se abandonar por uns tempos, dando-lhes, quando muito, uma chance aqui, outra acolá. Não raro, valem a pena e, hora dessas, sem que você espere, são capazes de deixar você nas nuvens.

Há aqueles que você mal larga, vem um outro e põe a mão. De repente, para seu desencanto, se tornam vulgares e andam de mão em mão.

Há os invejosos, os sem originalidade, que vivem querendo ser o que não são.

Há os muito formais, os levianos, os que preferem a meia-luz, outros a plena claridade. Há os lentos, os apressados...

Há os que gozam fácil e logo perdem a graça. Os que demoram, mas não chegam a nada.

Um livro bom é que nem a mulher amada: você não dá, não empresta, nem troca. A esse, sou fiel, nunca traio, tenho sempre ao alcance da mão, e afirmo, com o dedo em cruz, para com esse sou incapaz de qualquer ingratidão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário