terça-feira, 22 de março de 2011

O fim do amor romântico

A propósito da coluna sobre infidelidade feminina, leitora pede que discorra sobre o título. Diz ela: "Por que bovarismo?" Como se diz tanto em mais um aleijão linguístico brasileiro, 'então'... bovarismo é um termo cunhado pelo francês Jules Gaultier, inspirado no romance Madame Bovary, de Gustave Flaubert, para definir o descompasso entre o sonho (sempre maior do que as possibilidades concretas da pessoa) e a realidade. Os dicionários trazem normalmente, com pequenas diferenças, a seguinte definição: "Insatisfação romântica que consiste em querer evadir-se de sua condição, adotando uma personalidade idealizada, como fez a heroína do romance Madame Bovary, de Gustave Flaubert.

Usei-o, na minha crônica, por considerar que a insatisfação da mulher no casamento, decorridos alguns anos de convivência, pode em parte explicar a busca de aventuras fora do relacionamento. Aliás, obra do acaso, deslocando-me de carro até o trabalho, ouço no rádio uma pesquisa ainda mais curiosa -- se não hilária --, cujo conteúdo reproduzo aqui: "Três razões explicam de forma recorrente os casos de adultério: ganho de peso, ronco e desinteresse pelo sexo." A que ponto não estamos chegando! Pois é, o cara engorda, em decorrência ronca que nem um leão e, depois de anos com a mesma mulher, vai perdendo o interesse... Carente, a mulher busca um parceiro mais 'atuante'...

Bovarismo, insisto. A história, contudo, lembra-me uma outra: Calvin Coolidge, presidente dos Estados Unidos entre 1923 e 1929, visitava com a mulher uma granja, quando esta, ouvindo do fazendeiro que um touro era capaz de cobrir uma fêmea quarenta vezes por dia, não se conteve e falou: - "Por favor, conte isso para o meu marido." O fazendeiro atendeu ao seu pedido, mas o presidente americano, mais curioso ainda, indagou se isso acontecia com a mesma vaca, ao que o homem respondeu: - "Não, claro que não, com uma vaca diferente de cada vez." Coolidge, então, pede-lhe: - "Por favor, conte isso para minha mulher."

Tolices à parte, a edição de O Povo, desta segunda-feira 22, traz uma entrevista curiosa com a psicanalista Regina Navarro Lins, para quem o amor romântico está com os dias contados. Diz ela: - "A ideia de que um único parceiro possa satisfazer todos os aspectos da vida [do casal] pode se tornar coisa do passado." Sem meias-palavras, o que afirma a estudiosa é que cada vez mais um maior número de pessoas vai optar pelas relações múltiplas. E não foi assim com Emma Bovary?

Como um dos objetivos da coluna é animar culturalmente, minha cara leitora, recomendo-lhe ir para além do livro de Flaubert, que você diz querer ler por esses dias. Tempinho livre, aproveite para ver a adaptação de Claude Chabrol para o cinema. Na França da segunda metade do século XIX, visando ascender socialmente e ávida leitora de romances sentimentais (bem na linha do que mostram as novelas da tevê dos nossos dias), insatisfeita com a mediocridade da vida conjugal, como fuga da realidade, a heroína vai à procura dos seus muitos amantes. Até se matar, igualmente frustrada e depois de vender a alma ao diabo, ingerindo um punhado de arsênico. O drama psicológico de Emma, a ciclotimia típica da esposa insatisfeita, o martírio humano elevado a dimensões insuportáveis, minuciosamente respeitados por Chabrol. Um belo filme, com uma interpretação irrepreensível de Isabelle Huppert.

Um comentário:

  1. Olá prof. Alder!! Estou aqui divulgando meu novo blog de poemas: O POETA ALMOCREVE. Outra coisa: o senhor poderia me dar dicas e sugestões de como conseguir um patrocínio para publicar um livro de poesias? Um forte abraço!!

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