terça-feira, 20 de março de 2012

Pra não dizer que falei de flores

Seria engraçado, não fosse revoltante.

Quem não sabe que os processos licitatórios foram, são e continuarão a ser essa maracutaia, esse cambalacho, essa falcatrua, essa marosca que a matéria da TV Globo vem divulgando desde o último domingo? Quem não sabe que denunciar ou não sempre foi a mesma coisa neste império da bandalheira e da impunidade? Quem nunca ouviu falar que as licitações sempre foram de araque, nas prefeituras, nos governos estaduais, nos ministérios? Quem nunca viu 'laranjas' -- envelope debaixo do braço --, adentrando as salas das repartições em que se dão esses processos com a maior cara de pau, como se dentro deles não conduzissem as cartas marcadas de um jogo sujo? Dos acordos, dos vinte por cento das 'comissões'? Quem nunca deparou com esses larápios sentados às mesas de restaurante, diante do melhor uísque, comemorando o êxito de suas tramoias e insídias? Gozando de nossas caras?

Tão vergonhoso e indigno quanto essas práticas delinquentes, banalizadas através dos tempos pela indiferença de uma Justiça, em parte, também corrupta, é ver o cabotinismo de algumas de nossas mais altas autoridades, juízes, deputados, senadores, posando de sérios e fingindo estupefação e revolta diante da matéria divulgada pela maior rede de televisão do país... Como se não soubessem que é essa a realidade dos bastidores da administração pública brasileira, em seus diferentes níveis, desde épocas remotas. Como se nunca tivessem, alguns deles, participado dessa pouca vergonha, desse roubo institucionalizado que só agora parece ganhar foro de coisa séria. Grande novidade!

Como faço todas as manhãs, sento diante do computador para bater os olhos nos principais jornais do país. Em todos, todos os dias, notícias de escândalos e escândalos, roubalheira de toda ordem, malversação do dinheiro público, quadrilhas de paletó e gravata agindo às claras, sem que se faça contra os seus atores nada além do teatro diante das câmeras, espetáculos logo esquecidos em face de liminares e outros instrumentos de amparo à indecência que campeia Brasil afora.

Em São Paulo, está na Folha, a Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, que iniciara investigação contra 70 juízes, diante das evidências é condicionada a ampliar o alcance de suas ações aos 354 desembagadores da corte e a um sem-número de juízes de primeira instância. Naquele Estado, um ex-presidente do Tribunal de Justiça, só entre 2008 e 2009, liberou para si próprio R$ 1,5 milhão quando presidente da instituição. Roberto Bellocchi (é como se chama), defendeu-se com uma emenda que lhe saiu pior que o soneto: - "Isso acontece em todo tribunal!" Excrescência.

E o mais duro é saber que a soma com que Bellocchi aumenta a sua renda, é café pequeno comparada aos parâmetros com que hoje se estipula o preço da indecência nas câmaras de vereadores, nas assembleias legislativas, nos tribunais...

Como afirmou uma das empresárias mostradas pela câmeras da Globo, "é a ética do mercado!" Vergonha.




2 comentários:

  1. Sou seu leitor há anos e estava com saudade desse texto corrosivo, cáustico, desses seus petardos contra a política e contra políticos! Como nos velhos tempos. Valeu!É assim mesmo que a coisa funciona. Sou político e sei!

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  2. Olá!

    É verdade, Álder! Vergonhoso, deprimente... nos faltam adjetivos para expressar tanto mau-caratismo. No mundo, por ano, perdem-se cifras na casa dos trilhões com a corrupção. Só no Brasil, um dos países mais doutrinados nesta área, essa cifra chega aos bilhões. Meu Deus! Daria para arrumar esse país de cabo a rabo, de Oiapoque ao Chuí. Mas esse assunto daria muito pano pra manga, meu amigo, porque falaríamos ainda de CBF, Governo Federal com sua copa do mundo e se até, porque não, do “Apóstolo” Valdomiro (da Igreja Mundial). Porém você, maravilhosamente bem, já disse tudo, para não dizer que falei de flores: Seria engraçado, não fosse revoltante.

    Excelente texto, Álder!
    Abraços!!!

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