segunda-feira, 7 de maio de 2012

Mulheres apaixonadas

Li há pouco um texto curioso do Ivan Martins, que considero um dos melhores cronistas sobre relacionamentos, da atualidade. Intitula-se Mulheres apaixonadas e, como está claro, dedica-se a realizar uma leitura do comportamento feminino sob os efeitos de uma paixão. Para ele, de uma mulher apaixonada pode-se esperar tudo, menos a lucidez. Cita casos conhecidos, em que mulheres tomaram decisões impensáveis: uma, que largou o marido na França e foi viver em Nova York com um cara que só conhecia pela internet; uma, que trocou o marido por um homem mais jovem em plena gravidez; uma outra, que inventava viagens de trabalho só para encontrar o amante. Enfim, desses casos que conhecemos aos borbotões.

O texto, como disse, é muito bom. Mas peca num detalhe: por reproduzir afirmações que hoje estão, cada vez mais, na linha do improvável, o que, aliás, me parece ser um dos pontos falhos dessas análises dos comportamentos masculinos e femininos na hora em que cupido ataca. Vejamos: - "Enquanto o homem, cautelosamente, tenta manter o pé em duas vidas e pondera sentimentos e reações alheios, as mulheres se atiram. Para fora de casa, para a rodoviária, para o desconhecido. Avançam em direção à miragem que paira na outra ponta da corda, muitos metros acima do abismo. Querem a felicidade."

Se a metáfora é digna de um craque, a exemplo do belo cronista, a afirmação me soa um tanto preconceituosa. Explico-me: Se existe alguma coisa que desconhece a diferença entre gêneros, essa coisa é a paixão. Também conheci homens que se jogaram do alto sem paraquedas, muitas vezes por qualidades femininas que só eles conseguiam enxergar no objeto desejado. Para não falar de casos assustadores, como os divulgados nos noticiários de tevê diariamente. E não me refiro aos Lindemberg da vida, cujas histórias tiveram desfechos que não se circunscrevem aos elementos meramente passionais. A paixão é cega, é essa espécie de emoção hierática, essa perturbação dos sentidos, essa hipnose maravilhosa e avassaladora a que se entrega o ser em circunstâncias especiais de sua vida. Do homem e da mulher.

À certa altura, o cronista indaga: - "De onde vem esse romantismo terminal das mulheres? Eu não sei, mas ele está lá, desde que elas são meninas". É quando o cronista consegue perceber nessa emoção sem nome um viés cultural que não consigo ver. E vai além, dando voz ao machismo que seu belo estilo não conseguiu calar: - "As mulheres podem se dedicar ao trabalho, ao poder, ao dinheiro. [...] Podem viver sozinhas se assim quiserem, dedicadas 100% ao aprimoramento do espírito ou dos glúteos. Mesmo assim, o romantismo não desaparece".  

Quanto a mim, penso diferentemente. Vejo a mulher muito mais lúcida e racional em circunstâncias delicadas da paixão. Quando perde, por exemplo. Via de regra, é mais curto o período do luto. Entrega-se ao trabalho, aos filhos, faz e acontece, tira leite de pedras para dar a sua vida um novo rumo, até que a dor vá embora e se descubra aberta para novos relacionamentos. Sei de perto como homens gigantes se apequenam, se curvam, ainda que temporariamente, ao peso da dor e das perdas, quando o assunto diz respeito à mulher amada. Todos, rigorosamente todos, mesmo aqueles que se escondem por trás das aparências, e se abraçam aos travesseiros, durante a madrugada, os lençois inundados de soluços.

2 comentários:

  1. Amigo Álder, permita-me compartilhar com você a leveza do texto e a sua apropriação interior, no que se refere a paixões e os efeitos dela sobre o ser humano. Revi, em suas linhas, o Álder compromissado com suas ideias e essências. Gostaria de ter uma secadora de roupas para secar tantos lençois inundados de lágrimas e soluços e de paixões, mas, acho que eu não ganharia muito, pois, dentre tantos molhados, os meus estariam na frente. Grande abraço, amigo.

    ResponderExcluir
  2. Saudações, Álder!

    Como sempre, belo texto! E esse então, como os demais, veio do âmago. Agora, cá entre nós, sua explanação sobre o tema foi perfeita. Mas este assunto, você sabe, meu amigo, dá muito pano pra manga. É papo que não acaba mais, que faz até o dono do boteco sentar-se à mesa...

    Abraços!

    ResponderExcluir