quarta-feira, 8 de agosto de 2012

O homem ou a mulher ideal

Leio no blog de uma jornalista de renome sobre a declaração de Zezé di Camargo acerca da fidelidade masculina: - "Não existe homem fiel. Existe homem numa fase fiel". A frase, diz a cronista, teria sido dita pelo cantor nas circunstâncias de sua separação da mulher Zilu, com quem viveu por 30 anos e sobre quem, não faz muito, ouvi numa entrevista do mesmo Zezé, tratar-se de sua 'cara-metade'. Lembrei disso a propósito de considerar que não existe essa coisa de cara-metade. Cada vez mais fica provado: ama-se o amor, não o objeto amado. Ama-se, bem na linha do que professou Platão, aquilo que não se tem. Ou que se perdeu.

Em Todos dizem eu te amo, um filme antigo de Woody Allen, há sobre isso uma situação curiosa. Von, a personagem interpretada por Julia Roberts, simboliza bem esse tipo de fantasia que todo homem e toda mulher, em alguma medida, vivencia cedo ou tarde. A uma dada altura, Von revela ao seu psicanalista o que considera ideal num homem, o tipo com quem gostaria de viver para sempre. Descobrindo os parâmetros de avaliação da moça, a personagem interpretada por Woody Allen a conquista e passa a se conduzir pelo modelo sonhado. Resultado: em pouco tempo o casal se separa. É que Von descobre-se uma inconstante: se o homem a satisfaz por completo não serve, ela precisa estar insatisfeita.

Na vida, por inconsequente que seja, é mesmo assim. Por isso, o príncipe encantado logo, logo, vira um chato. A mulher, um dia encantadora, torna-se, com o passar dos anos, uma companhia insuportável. E aquele jeito carinhoso com que lhe tratava no começo da relação? Pois é, virou um troço sem graça, pegajoso, insuportavelmente derramado. A sua outra metade, que "nascera para você", no fundo era "uma dominadora", "um ser egocêntrico, incapaz de fazer alguém feliz". E você, sem se dar conta, passa a viver de devaneios, de buscas, pulando de galho em galho (ou sonhando com isso), que um dia, você pensa, haverá de encontrar aquele ou aquela que vai preencher seu vazio, completar seu mundo.

Não faz muito, lendo Éric Vartzbed, deparei com duas declarações da atriz Mia Farrow que, por oportuno, tomo a liberdade de reproduzir aqui. A primeira, quando a atriz tinha 19 anos: - "Quero fazer uma grande carreira, casar com um grande homem e ter uma vida notável. É preciso ver longe, é o único meio de chegar lá". A segunda, aos 59: - "Agora entendo: viver é aprender a perder com a maior elegância possível... e ser capaz de aproveitar tudo que se oferece a você".

Escusável dizer: Mia Farrow é uma atriz extremamente talentosa, e uma mulher cujo equilíbrio e forma de conduzir a vida é admirada por todos. Um dia, deparou com alquém que julgou ser o "grande homem ideal". Deu no que deu. Woody Allen, era este o seu nome, apaixonou-se pela enteada, desfez seu casamento com Farrow e a mergulhou por uns tempos, ainda que não possa ser condenado por isso, num mar de decepção e amargura. Mia se refez, reconstruiu sua vida e, incontestável!, soube 'perder com a elegância possível e foi capaz de aproveitar tudo que a vida lhe ofereceu'. É feliz, até onde se sabe, e leva adiante uma carreira brilhante.

O segredo, se segredo existe, está em descobrir, um dia, que nunca nasceu nem nascerá a mulher ou o homem ideal. Existe alguém com quem nos identificamos, depois de muitos erros e tropeços, muitas buscas, muitos encontros e desencontros. Alguém, como nós, detentor de qualidades e defeitos, que, feitas as contas e contabilizadas as vantagens e as desvantagens, é capaz de nos mostrar, como num filme de Benigni, que "a vida é bela" e que cabe a cada um de nós saber aproveitar do outro o que tem de bom, bem como dar a ele ou ela o que há de melhor em nós. Quem sabe não seja isso o que chamam de felicidade?!


Um comentário:

  1. Saudações, Álder!

    Embora você tenha declarado, certa vez (se não me engano), em uma de suas crônicas, que achava o Ivan Martins um mestre na arte de escrever sobre relacionamentos, confesso que, já tendo lido algumas delas, você tem tutano pra isso, pra esse tema. Suas palavras têm tutano, têm propriedade, etc. Belíííííííííssima crônica!

    Sucesso sempre.

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