quinta-feira, 18 de abril de 2013

Do Trussu à Tropicália

Na privilegiada companhia dos casais Alfredo Felipe/Vera e Laudenir/Luciene, que nos acolheram com um carinho que bem expressa a elegância e gentileza de ambos como anfitriões, Ticiana e eu curtimos o mais belo crepúsculo vespertino do Ceará em meio às águas do açude Roberto Costa, no fim de semana passado. Entre os muitos assuntos, regados a bom uísque, Alfredo e eu dedicamo-nos a relembrar os tempos de Câmara Municipal, os pronunciamentos da tribuna, os debates não raro turbulentos e a invariável capacidade de restaurar a calma com que sentávamos à mesma mesa ao final de cada sessão, uma das marcas daquela geração de novas lideranças que faziam a diferença. Pela qualidade intelectual do grupo, pela disposição de trabalho e pela correção no trato das questões de interesse público, parece unânime a afirmação de que, à época, Iguatu vivia um dos seus momentos políticos mais elevados. Pluralidade, competência, apuro intelectual e correção ética foram qualidades relembradas, não por mim e Alfredo, vereadores então, mas por Luciene, cujo nome, irrepreensível, só algum tempo depois despontaria nos meios partidários da cidade. A propósito do final de semana, Ticiana e eu agradecemos, ainda, a gentileza de Paulo de Tarso, que, elegante como de costume, colocou-nos à disposição sua aprazível casa do Trussu.

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Chega às livrarias, em edição de 2013, a nova História do cinema, de Mark Cousins, mais que mais um livro sobre a história da sétima arte. Como afirmou Bernardo Bertolucci sobre a obra, o autor vai fundo no seu livro nas questões mais relevantes de cada fase do cinema e "seu livro torna-se um travelling infinito dos mistérios dos filmes [...] e daqueles que os fazem." O livro tem personalidade, notabiliza-se pela originalidade com que seu autor, sem perder a paixão jamais, consegue ser imparcial nas questões mais delicadas, como quando faz um mapeamento rigoroso do que houve de mais representativo na história do cinema dos clássicos mudos ao cinema moderno. O capítulo em que trata do período que se estende de 1945 a 1952, em que explora o surgimento de uma nova linguagem cinematográfica, é primoroso, mesmo para os iniciados e os mais exigentes.

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Também à disposição dos amantes da música popular brasileira, em DVD, o belo filme Tropicália, de Marcelo Machado, a que só pude assistir ontem. Um trabalho precioso sobre um dos mais exuberantes momentos da cultura brasileira, uma vez que se trata de um movimento muito mais amplo do que pensa a vã filosofia, que tende a reduzi-lo entre as fronteiras da música. Se Tropicalismo é apenas um modismo estético passageiro, como lembra no documentário Gilberto Gil, Tropicália é algo muito mais profundo do ponto de vista cultural, uma retomada da busca do caráter nacional do país por que se empenharam inteligências geniais, a exemplo de Mário de Andrade e Sergio Buarque de Holanda.

 

Realizado com um rigor artístico que, por si só, já justificaria a repercussão que teve, Tropicália, o filme, é trabalho para se ver, rever e ter em casa, ao alcance da mão, razão por que o recomendo para cinéfilos, apreciadores da boa música popular, professores e estudiosos da brasilidade. As passagens em que são mostrados momentos dos festivais da canção são imperdíveis, notadamente aquele em que Caetano Veloso, expoente da Tropicália, encara a plateia com o famoso discurso de improviso sobre política e estética: "Vocês não estão entendendo nada. É essa a juventude que pensa transformar o Brasil? Se vocês são com relação à política o que são com relação à estética, nós estamos ferrados!" (Cito de memória) Nada tão atual. Qualquer semelhança com as opções estéticas da juventude de hoje, pode-se ver, não é mera coincidência.    

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