segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Em tom de conversa

Se a droga sempre foi um dos graves problemas de saúde pública, hoje adiciona-se a isso um fator muito mais grave: o da violência, por exemplo, que grassa no dia a dia dos brasileiros de forma a nos tirar qualquer alento em relação ao futuro. A coisa vem se tornando insuportável. Todos os dias assassinatos ocorrem para que dependentes encontrem, como num passe de mágica, condições para ter em mãos o veneno, que muitas vezes, sabe-se, é o desejo de ter acesso aos bens de consumo típicos da sociedade pós-moderna.
 
Dia desses, comentando com amigos o problema, ouvi de um deles: "A droga existiu e vai existir sempre! Não é diferente agora!", pasmem. É o que tenho escutado vez e outra, e a que me oponho. Explico-me.
 
Se é verdade que o consumo de drogas atingiu patamares chocantes nos anos sessenta, setenta, não é aceitável dizer que o seu consumo resultava nos mesmos problemas de hoje ou que fossem graves na mesma medida as suas consequências sociais. Nas décadas de sessenta, setenta a droga estava inserida num contexto de amplitude maior, diria mesmo cultural  --  ou contracultural, para ser mais preciso. Havia um ideário por trás disso. Buscava-se um tipo de autenticidade, de descoberta de caminhos alternativos para o 'sufoco' advindo de uma nascente sociedade consumista de feitio pós-industrial.
 
À violência dos valores burgueses da época, que tinham lá suas particularidades se comparados aos de agora, os jovens contrapunham outras narrativas, empenhavam-se em romper com a ordem então vigente, o status quo dominante. Os signos dessa ruptura com o "estabelecido", que variavam da forma excêntrica de vestir-se ao radicalismo pacifista do movimento hippie, entretanto, obedeciam à uma vontade de transgressão e a um certo inconformismo utópico de quem sonhava com um retorno ao passado mais igualitário, mais justo e mais livre. Pelo menos na ótica dessa juventude.
 
É nesse contexto que a droga aparecia como uma alternativa, infeliz é verdade, muitas vezes perversa para seus usuários (Jimmi Hendrix, Jim Morrison, Kurt Cobain, River Phoenix, Janis Joplin*), contra o estranhamento provocado pela dureza de um mundo que parecia desprovido de humanidade. A linha de fuga, todavia, remetia à paz e ao amor do jargão hippie e a frases como All You Need is Love, pois "tudo o que você precisa é de amor", nas palavras de um dos maiores ídolos da época, John Lennon.
 
Havia, é claro, casos de violência entre os consumidores de droga. Não se trata, aqui, de fechar os olhos para o que existe de nefasto onde quer que a droga esteja, mas de chamar a atenção para o fato de que o maior mal não está na sua descriminalização, a exemplo do que se pretende em relação à maconha, mas na indústria criminosa que a produz e comercializa. Sem esquecer, claro, o vazio existencial de uma geração que me parece condenada à sua própria sorte em tantos sentidos, o que a faz menos poética e sonhadora que aquela a que pertencíamos os adolescentes dos anos 70.
 
*Sem ordem cronológica e falando apenas de vítimas famosas. 
 
 
 
 
 
 
           

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