sexta-feira, 1 de abril de 2016

A atualidade de Kafka

Natural de Praga, na antiga Tchecoslováquia, Franz Kafka é um dos escritores mais influentes da literatura universal. Escreveu romances e contos que romperam os limites geográficos e temporais, todos marcados por uma sensação claustrofóbica e angustiante que resultariam num adjetivo usado, até mesmo por quem jamais leu qualquer dos seus livros, para definir o beco sem saída, o desespero de quem se sente impotente diante do caos, da perseguição sem causa e do arbítrio que reduz a condição humana à bestialidade mais insuportável: "Kafkiano".
 
O conto A Metamorfose, supostamente o mais conhecido dos escritos de Kafka, narra a história do caixeiro-viajante Gregor Samsa, que desperta uma certa manhã sob o pesadelo de ver-se transformar num grande inseto, passando, a partir desse fenômeno surreal, a viver as mais inusitadas situações, que culminam com o abandono de sua própria família e a sua morte solitária.
 
Em outro, O Veredicto, um filho é levado pelo próprio pai a cometer suicídio. A leitura crítica dos contos de Kafka, pois, aponta para um simbolismo que se reatualiza com o passar dos tempos e retrata a falta de perspectiva do homem diante do desconhecido, da ganância do poder a todo custo, das práticas fascistoides a que se vê de repente e injustificavelmente condenado.
 
Mas é com romance O Processo que o escritor tcheco atinge o mais elevado estágio de ficcionista genial que foi. Aqui a personagem central é Joseph K., preso e condenado à morte sem motivo, sem explicação possível, sem direito a defender-se da acusação de um crime que jamais cometeu. A narrativa desenvolve-se num clima de absoluto desespero, claustrofobia e náusea que toma de assalto o leitor. O livro seria objeto de uma adaptação cinematográfica notável, The Trial, filme dirigido por Orson Welles e com Anthony Perkins no papel de Josef K.
 
O romance tem início com a prisão de Joseph K., sem nada que a justifique, como é próprio nos regimes totalitários e nas práticas hediondas do fascismo. A fala do agente policial é emblemática: - "Não  --  retrucou o homem que estava junto à janela, deixando o seu livro sobre uma mesinha e pondo-se de pé. Você não pode sair, está detido".
 
Impedido de movimentar-se e sair do quarto à procura dos seus direitos legais, Joseph K. pede explicações para o que se passa, mas a resposta é "kafkiana": - "Não me cabe explicar isso. Volte para o seu quarto e espere ali. O inquérito está em curso, de modo que se inteirará de tudo em seu devido tempo".
 
Começa, assim, o martírio da personagem de O Processo. O labirinto que terá de percorrer à procura de seus direitos, nunca alcançados, materializa a absoluta ausência de um Estado democrático de Direito.
 
À dada altura, Joseph K., busca entender o absurdo da situação em que se vê inexplicavelmente envolvido: - "Que espécie de homens eram estes? De que estavam falando? A que Departamento oficial pertenciam? Quem eram aqueles que se atreviam a invadir sua casa?" Impotente, ainda tenta argumentar: - "Aqui está meus documentos de identidade; mostrem-me os seus e, especialmente, a ordem de prisão".
 
O romance metaforiza, à perfeição, a destruição dos valores democráticos, o solapar dos direitos do homem e da legitimidade da ordem pública. Adverte-nos, com sua representação alegórica, de como se processam os mecanismos totalitários e de como se dá a implantação do autoritarismo mais vil e repugnante. Sombrio e assustador, exemplifica o desastre que se anuncia, ansioso e alienador. Sua leitura, por certo, ajudaria a compreender o que se passa hoje no Brasil, com sua história protagonizada por Sérgio Moro e cia. 
 
 
 

 
 
 
 
  
            
           

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