Quando o Ernesto, durante o happy hour, revelou que há 3 anos luta contra a saudade da ex, todos riram à mesa. Cá comigo, pensei: Nem se dão conta de que, como quis Wilde (Oscar, o escritor inglês), não raro a vida imita a arte. Na eternidade de um instante, passei em revista alguns clássicos sobre o assunto, que foram das canções dos trovadores medievais à obra-prima de Gabriel García Márquez, O amor nos tempos do cólera, em que Florentino Ariza espera exatos 53 anos, quatro meses e onze dias até conquistar em definitivo o coração da mulher amada. Sobre o livro -- e a bela adaptação para o cinema por Mikel Newell --, por sinal, já escrevi aqui.
Como as coincidências acontecem, chego em casa e vejo nas páginas da revista Época um texto maravilhoso de Ivan Martins, que tomo a liberdade de citar: - "Tem gente que vai ficando na nossa vida. A gente conhece, se envolve, termina, mas não coloca um ponto final. De alguma forma a coisa segue. Às vezes, na forma de um saudosismo cheio de desejo, uma intimidade que fica a milímetros de virar sexo".
De fato, quem não vive ou viveu algum dia uma experiência assim? Afinal, nenhuma relação acaba por vontade medida dos dois. Em todo rompimento há sempre alguém que sai machucado, quando menos porque, como lembra Martins, "talvez seja inevitável, uma vez que nem todas as relações terminam com o total esgotamento emocional. Na maior parte das vezes, temos dúvida, temos afeto, temos tesão, mas as coisas, ainda assim, acabam". Perfeito.
O mais curioso é como certos amantes, utópicos, carregam no peito o sorriso da mulher amada, quando a relação termina. Falo isso e me ocorre lembrar a cena clássica de Cinema Paradiso, em que Alfredo narra para Totó a misteriosa história: Certa vez um soldado apaixona-se pela filha de um Rei. A moça resiste à primeira tentativa de sedução, mas, comovida com a força do amor revelado, pede ao rapaz o prazo de cem dias para decidir. Em caso afirmativo, diz ela, 'em qualquer desses cem dias aparecerei no balcão do castelo'. E o rapaz fica ali um, dois, vinte, noventa dias, sob o sol escaldante das tardes e o frio insuportável das noites, mas a moça não lhe aparece. No nonagésimo nono dia, o pobre homem levanta-se e desaparece na estrada infinda. "Não me pergunte por quê!", determina Alfredo.
É que para o amante não amado é preferível a dúvida à certeza do não. O rapaz liga para a moça que ama, mas não fala, tem medo do que virá do outro lado da linha; escreve cartas, mas pede que não lhe responda; passa e-mails que devem apenas ser lidos. Para ele, mais vale a esperança do silêncio, a possibilidade improvável do sim, que a gota dágua que afoga e mata. Ao Ernesto, estou certo, ocorre ser o soldado da vez, à espera de que a amada, de repente, não mais que de repente, diria assim o poeta, lhe apareça no alto do balcão.
"A rigor -- está na crônica de Ivan Martins --, a gente pode entrar numa dessas com gente que nunca namorou. Basta às vezes o convívio, uma transa, meia transa, e lá está você, fisgado por alguém com quem nunca dormiu – mas de quem, subjetivamente, não consegue se esquivar. Telefona, cerca, convida. Estabelece com a pessoa uma relação que gira em torno do desejo insatisfeito, do afeto não retribuído. Vira um caso inacabado que nunca teve início, mas que, nem por isso, chega ao fim. Um saco". Há amores que são assim.
Como as coincidências acontecem, chego em casa e vejo nas páginas da revista Época um texto maravilhoso de Ivan Martins, que tomo a liberdade de citar: - "Tem gente que vai ficando na nossa vida. A gente conhece, se envolve, termina, mas não coloca um ponto final. De alguma forma a coisa segue. Às vezes, na forma de um saudosismo cheio de desejo, uma intimidade que fica a milímetros de virar sexo".
De fato, quem não vive ou viveu algum dia uma experiência assim? Afinal, nenhuma relação acaba por vontade medida dos dois. Em todo rompimento há sempre alguém que sai machucado, quando menos porque, como lembra Martins, "talvez seja inevitável, uma vez que nem todas as relações terminam com o total esgotamento emocional. Na maior parte das vezes, temos dúvida, temos afeto, temos tesão, mas as coisas, ainda assim, acabam". Perfeito.
O mais curioso é como certos amantes, utópicos, carregam no peito o sorriso da mulher amada, quando a relação termina. Falo isso e me ocorre lembrar a cena clássica de Cinema Paradiso, em que Alfredo narra para Totó a misteriosa história: Certa vez um soldado apaixona-se pela filha de um Rei. A moça resiste à primeira tentativa de sedução, mas, comovida com a força do amor revelado, pede ao rapaz o prazo de cem dias para decidir. Em caso afirmativo, diz ela, 'em qualquer desses cem dias aparecerei no balcão do castelo'. E o rapaz fica ali um, dois, vinte, noventa dias, sob o sol escaldante das tardes e o frio insuportável das noites, mas a moça não lhe aparece. No nonagésimo nono dia, o pobre homem levanta-se e desaparece na estrada infinda. "Não me pergunte por quê!", determina Alfredo.
É que para o amante não amado é preferível a dúvida à certeza do não. O rapaz liga para a moça que ama, mas não fala, tem medo do que virá do outro lado da linha; escreve cartas, mas pede que não lhe responda; passa e-mails que devem apenas ser lidos. Para ele, mais vale a esperança do silêncio, a possibilidade improvável do sim, que a gota dágua que afoga e mata. Ao Ernesto, estou certo, ocorre ser o soldado da vez, à espera de que a amada, de repente, não mais que de repente, diria assim o poeta, lhe apareça no alto do balcão.
"A rigor -- está na crônica de Ivan Martins --, a gente pode entrar numa dessas com gente que nunca namorou. Basta às vezes o convívio, uma transa, meia transa, e lá está você, fisgado por alguém com quem nunca dormiu – mas de quem, subjetivamente, não consegue se esquivar. Telefona, cerca, convida. Estabelece com a pessoa uma relação que gira em torno do desejo insatisfeito, do afeto não retribuído. Vira um caso inacabado que nunca teve início, mas que, nem por isso, chega ao fim. Um saco". Há amores que são assim.
amo suas crônicas!!!!
ResponderExcluirquero todos os seus livros, professor!
sou sua fã de carteirinha!
Obrigado pelo carinho e pelas visitas ao blog. Faça-o sempre!
ExcluirOlá, Álder!
ResponderExcluirQue texto maravilhoso, meu caro. Fico aqui com pesar do (fictício ou não) Ernesto. Mas a mulher, empossada por Deus como adjutora (o que permanece ainda em algumas culturas), está agora em pleno curso de superar essa fase, até certo ponto atual: da qual ela detém o poder de decisão, de resposta, de escolher entre o dizer “sim” e o dizer “não”... e passar a fase seguinte (já em vigor em certos “mundos”) cuja mesma lhe dará plenos poderes de escolher entre este, aquele e os demais, o que parece ser uma inversão de papéis. Sem machismo aqui da minha parte, é claro. Afinal, quem sou eu para mudar a evolução da espécie. Não sei se fui muito claro, mas espero ter sido compreendido (risos).Que bobagem essa minha, hem?!
Um grande abraço!
O título de sua crônica foi um convite para eu mergulhar na poética de sua escrita. Parabéns pelo belo texto.
ResponderExcluirAh!Ontem pela madrugada estive lendo suas memórias. Gostei muito. Selecionei primeiro as que falam sobre literatura, embora eu não seja desta área, mas sem ela não vivo.
Abraço,