sábado, 26 de novembro de 2016

Fragmento de crônica sobre Fidel Castro, do livro Do Amor e Outras Crônicas

"Vi-o uma vez, a uma distância de 20, 30 metros. Era a primeira posse de Lula como presidente. Compúnhamos uma multidão em frente ao palanque onde se viam chefes de Estado os mais diferentes. Eis que ouço a voz de uma jovem a poucos passos: "Fidel, meu! Fidel, meu! É ele, vê lá! É Fidel, meu!" Só então pude entender o que se passava. Fidel surgira, como que por milagre, do fundo do palanque. Não saberia descrever a emoção que tomou conta de todos naquele instante. Mas lembro que abri o mais largo sorriso de que já fui capaz, enquanto duas lágrimas, lentamente, caíam-me pelas maçãs do rosto. Foi aí que senti um aperto de mão da minha companheira. Olhei-a, e, tomado de uma sentimento que jamais serei capaz de definir com exatidão, pude ver que estava em prantos, dominada pela força de sua emoção, maior e mais bonita que a minha naquele momento. Abraçamo-nos como que extasiados, acompanhando com os olhos atentos a trajetória percorrida por aquele homem imensamente alto, para quem, em sortilégio, todos os olhares se voltavam, na eternidade de um instante. A praça delirava em presença do mito.

Durante quase cinco decênios, Fidel Castro sobrevivera a dez governos americanos  --  seus inimigos figadais --, a algo em torno de 600 tentativas de assassinato e a uma invasão dos EUA. A exemplo de Che, tornara-se revolucionário após abdicar do confortável cotidiano de filho de um latifundiário rico para se dedicar aos pobres de Cuba. Quase menino, liderara uma greve contra o próprio pai, julgando injustiçados aqueles que lhe prestavam serviço em suas terras. Com 18 homens, apenas, enfileirou-se contra Fulgêncio Batista e seu reduto de corrupção, máfia, jogatina, prostituição, que faziam do país, como disse, um tipo de bordel dos ricos norte-americanos. Arrebanhou apoio entre os camponeses da serra Maestra; enfrentou fome, sede, frio, sofrimento físico e emocional, até consolidar a vitória da guerrilha, em inícios de 1959. Colocou Cuba entre os países com melhores índices de crescimento social; acabou com o analfabetismo, deu-lhe status de país-referência em termos de saúde e elevou para quase 80 anos a expectativa de vida dos moradores da Ilha. Mas matou em nome da Revolução, e permaneceu no poder por 49 anos.

Sem rasgos de esquerdismo caduco, lamento se só isso vier a pesar no julgamento que a lhe fará a História."

Um comentário:

  1. Marcou a política mundial com sua histórica resistência aos desmandos do império do Norte da América.
    Criou condições efetivas para, com sacrifícios é verdade, consolidar a dignidade de toda uma nação e, com seus erros e acertos, fez a revolução possível.
    Aos que dirão que era um ditador e assassino, apenas digo que não fora tanto quanto o foram os seus detratores e oponentes. Afinal, não se faz ou se mantém uma revolução regando flores, mas, sim, combatendo os inimigos.

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