sábado, 26 de janeiro de 2013

Arte e violência em Django

Escrever sobre cinema, num blog tão despretensioso quanto o meu, é correr o risco de ser incompreendido e julgado atrevido. Afinal, como lembra um conhecido blogueiro brasileiro, escrever na internet é se expor ao clima de torcida organizada que toma conta de algumas discussões. Mesmo assim, em respeito aos que leem o que se publica neste espaço (ano passado foram quase 15 mil visitas, sem contar os leitores da versão impressa), e pelo amor à arte, não me furto ao desafio. Fui ver Django Livre, o último Tarantino (o Corinthians da tela grande), e vou comentar.
 
Não gostei. O filme, mais do que em toda a obra do cineasta americano, estetiza a violência do começo ao fim. Algumas cenas, visando aos entusiastas do diretor, chegam a ser engraçadas, como na sequência final, em que um tiro certeiro de Django faz desaparecer do quadro, como um foguete, uma mulher. E o público ri mesmo, ri muito. O efeito, recorrente num filme de ação vespertino, não caberia ali, quando se aproxima a "estase" (como está escrito, com S mesmo, o momento dramático em que todas as forças se equilibram e resulta na falta de movimento).
 
Mas os defeitos estruturais do filme são maiores: o roteiro não está à altura de Tarantino, sobretudo o de Bastardos Inglórios, referindo-me, obviamente, a um filme quase perfeito. Não me parece bem escrito, especialmente por se tratar de um filme que discorre sobre uma questão muito grave, como o verdadeiro holocausto a que foram submetidos os negros americanos através dos tempos. Nesse sentido, considero razoável o julgamento de Spike Lee: "A escravidão não foi um spaghetti western de Sergio Leone". Sob este aspecto, o filme de Tarantino reedita a mesma visada dos roteiristas americanos sobre a questão indígena. Fica na superfície.
 
A trama, a organização dos eventos dramáticos do argumento, gira em torno do martírio de Django (Jammie Foxx, numa interpretação que observa a estilização já conhecida de outros filmes do diretor), é libertado pelo Dr. King Shultz (Christoph Waltz, excelente, como sempre), um caçador de recompensas alemão, e decide acompanhá-lo na sua empreitada: chegar até os irmãos assassinos Brittle, no sul dos Estados Unidos. Ali, sem que saiba do paradeiro dela, Django vai deparar com Broomhilda (Karry Washington), sua esposa, escrava de Calvin Candie (Leonardo DiCaprio, sublime no papel). E vem o previsível.
 
Notável no filme, embora sem atingir o mesmo nível de genialidade de Cães de Aluguel, por exemplo, a forma fílmica, como a composição de alguns planos, plasticamente maravilhosos, e o manuseio inconfundível da câmera, que fazem lembrar, num e noutro momento do filme, a sequência de abertura de Bastardos Inglórios, um marco do cinema contemporâneo.
 
Mas é a estetização da violência, uma característica incontornável de Quentin Tarantino, capaz de levantar a torcida, que sobressai em Django Livre (com D mudo, diz Jammie Foxx). A cena de luta entre escravos, diversão e negócio de Candie, é um dos destaques do filme. Para não falar numa anterior, em que cães devoram um escravo sob o olhar revoltado e silencioso de Django. Mas a câmera, não seria Tarantino se não o fizesse, deixa ver. 
 
 

3 comentários:

  1. Olá, Álder!

    Sensacional a abertura de seu texto. Sabemos que você não se deixará vencer pelas forças sonoras de meia dúzia de torcedores da “Turma do Amendoim”. Continue nessa labuta. Seus textos são ótimos e nos ajudam a entender, avaliar e escolher uma película para o fim de semana com a patroa. (rsrsrs) Ah, e parabéns pelos 15 mil acessos. Este ano virão muito mais.

    Sucesso sempre!

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  2. Olá, Álder!

    Sensacional a abertura de seu texto. Sabemos que você não se deixará vencer pelas forças sonoras de meia dúzia de torcedores da “Turma do Amendoim”. Continue nessa labuta. Seus textos são ótimos e nos ajudam a entender, avaliar e escolher uma película para o fim de semana com a patroa. (rsrsrs) Ah, e parabéns pelos 15 mil acessos. Este ano virão muito mais.

    Sucesso sempre!

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  3. Adorei o texto, Álder! E concordo em muitos aspectos com você nesta crítica! Um Tarantino menos elaborado, sem dúvida, ainda que mantenha alguns de seus méritos! Grande abraço!

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