segunda-feira, 8 de junho de 2009

Quando o desejo acaba

Dia desses, conversávamos em grande roda sobre infidelidade. É tema de pauta, num tempo em que "ficar" é a palavra que define uma relação sem compromissos. De ambas as partes, óbvio. Penso que a infidelidade acontece quando um relacionamento, por sólido que pareça, vai se tornando frio e o outro não desperta mais que amizade, companheirismo, esses pequenos-grandes valores que, sendo a essência do que deveria ser chamado amor, não são capazes de preencher o tesão pela vida.

Quando isso ocorre, e quase sempre ocorre, a porta estará aberta para a aventura. É isso infidelidade? Não sei se a palavra se aplica adequadamente, hoje em dia, para definir aquela saidinha que, nessas circunstâncias, cedo ou tarde vai acontecer. Não se trata de fazer o elogio da traição, pelo contrário. O ideal seria que o passar dos tempos tão-somente fizesse crescer a atração por aquele ou aquela com quem se decidiu viver. Mas nem sempre é assim que as coisas ocorrem. Chega um tempo em que desaparece o encanto, a química, a mágica que "um dia nos fez desmoronar na presença do outro." E a vida vai se tornando uma rotina pesada ao lado de alguém que escolhi para dividir comigo a mesma casa, a mesma mesa, a mesma cama. Há um tempo em que a pessoa que foi objeto da melhor emoção, dos mais inesquecíveis sonhos, é apenas a pessoa de quem se passou a conhecer os defeitos, os vazios interiores, as manias 'insuportáveis'.

Lya Luft tem uma crônica em que levanta, pouco mais, pouco menos, a seguinte questão: - "Se um dia, depois de muitos anos de casamento, há tempos transformado em amizade, o outro nos pedir a liberdade, numa prova da lealdade que sempre exaltamos, qual vai ser a nossa reação?" Se nos propuser: - "Somos amigos, bem amigos, mas é hora de vivermos separados!", como vamos entender isso? Estou convencido de que ninguém aceitará tal proposta sem muito sofrimento, quando o desejo do outro acaba. Na hora em que se sente preterido, o mundo desaba sobre a cabeça e sente-se vontade de morrer. E, no entanto, quantas outras dores seriam evitadas, se se soubesse lidar com essa realidade!

Infidelidade, nessas circunstâncias, é palavra dura demais para ser empregada. Está no dicionário: 'Qualidade de infiel', que, por sua vez, é como se define 'quem não cumpriu aquilo que se obrigou ou se obriga.' O amor não é obrigação. O amor é dádiva. O amor é a união da amizade com o desejo. Se se desgastou, como diz a cronista, 'por que não nos permitimos a quebra do contrato' e partimos para a condição de amigos? Quase nunca isso é possível para quem perdeu o posto de objeto adorado. Haverá sempre a resistência, a tentativa em desespero de segurar o que já está no chão, em pedaços. Por isso, a aventura pode vir a passos largos. Na conversa a que me referi acima, mal e mal, citei Jabor: "O amor depende do nosso desejo, é uma construção que criamos. Sexo não depende do nosso desejo; nosso desejo é que é tomado por ele."



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