domingo, 31 de maio de 2009

Apelo

Pesquisa divulgada hoje aponta: o brasileiro está casando mais. Bonito. O outro resultado da mesma pesquisa, infelizmente, desaponta: O brasileiro está separando mais. Neste ano o número de separações legais superou todas as estatísticas. Pena. Se o casamento é uma instituição falida, como afirmam alguns (e os números parecem confirmar isso), por que tantos homens e tantas mulheres decidem tentar a vida a dois? Que leva as pessoas a tentarem viver "junto", dividir camas e lençóis, como se a felicidade fosse, necessariamente, uma experiência de cumplicidade? Levantamentos indicam que é cada vez maior o número dos que moram só - e conseguem estar de bem com a vida. Nos supermercados, cresce a oferta de produtos para solteiros, o que facilita a vida daqueles em cuja mesa um só talher é bastante. Mas, a pesquisa indica, aumenta o contingente dos que acreditam na utopia do improvável: "... até que a morte os separe".
Não é sem razão que o tema do amor frustrado povoa o imaginário das pessoas e o cancioneiro popular é pródigo em cantar os desencontros. Há mesmo, entre os grandes compositores, quem parece ter se especializado em cantar essa dor. E não estou falando de Lupicínio, que seria um tipo de redundância. É de Vinícius que estou falando, é de Chico Buarque (perfeição!) e de Roberto Carlos, para ficar nos emblemáticos que tematizaram em suas canções o insucesso dos relacionamentos e o sofrimento que advém disso. Na literatura, é inimaginável a quantidade de livros que exploram o tema, verdadeiros clássicos da poesia e da prosa de ficção. Romances, novelas, contos. No cinema, então. Quem haverá de esquecer a cena memorável de Casablanca? A propósito, na busca de um "mote" para a coluna de hoje, larguei o jornal com os dados da pesquisa e fui à estante, queria um texto que lhe fizesse contraponto, que ilustrasse a minha coluna de hoje. Caiu-me às mãos esta pérola de Dalton Trevisam:
Amanhã faz um mês que a Senhora está longe de casa. Primeiros dias, para dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa da esquina. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, e até o canário ficou mudo. Para não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite eles se iam e eu ficava só, sem o perdão de sua presença a todas as aflições do dia, como a última luz na varanda.
E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tempero da salada - meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? Às suas violetas, na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa, calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolhas? Nenhum de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.


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