Volta e meia me perguntam se Capitu traiu Bentinho ou não. Professores, alunos e leitores, bem ou mal formados na fascinante experiência de ter um livro nas mãos, insistem na tola curiosidade. O interessante para muitos é que tenhamos uma conclusão sobre a dramática vida do casal de Cosme Velho, como quem sente um prazer inconfessável ao saber da intimidade dos outros. Faz parte da bisbilhotice, da maledicência que é, ainda, uma de nossas pragas. Não sabem que o livro de Machado de Assis é muito mais que um livro sobre o adultério, se é que, de sã consciência, pode-se dizer que é um livro sobre o adultério.
Prefiro dizer que é um romance que trata do ciúme, daquele monstro dos olhos verdes de que nos falou Shakespeare na peça Otelo. Ou, para alcançar com mais exatidão o fio condutor da trama, trata-se da dolorosa história de um homem em dúvida, mergulhado, até a raiz dos cabelos, na conflituosa disposição de acusar a esposa, supostamente envolvida em sentimentos com o seu melhor amigo, Escobar. A história, para os que ainda não a puderam ler, em rápidas palavras, é a seguinte: Bento Santiago, como um Proust brasileiro, tenta reconstruir o seu passado através da memória, recordando o amor ingênuo por Capitu (a quem descreve no romance como detentora de "olhos oblíquos e dissimulados", "olhos de cigana", "olhos de ressaca"); a entrada forçada no seminário como pagamento de uma promessa da mãe; o abandono da vida de seminarista; o casamento e a íntima convivência com Escobar - como ele, advogado -, e sua mulher Sancha; o nascimento do filho, Ezequiel, e o surgimento das primeiras dúvidas sobre a lealdade de Capitu.
Exímio nadador, numa ironia do destino, Escobar morre afogado e no seu velório Bentinho observa que Capitu olhava "alguns instantes para o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa..." como "se quisesse tragar também o nadador da manhã." Nasce a desconfiança que aumentará com o passar do tempo e culminará com a suspeita de que Ezequiel é filho de Escobar, de cuja imagem fisionômica guarda traços para ele visíveis.
O casamento, por razões óbvias, desmorona. Capitu parte para a Europa com o filho, morre algum tempo depois. Ezequiel vai para a África e lá vem também a falecer. Bentinho tem como única saída tentar vencer a dolorosa solidão.
Da sinopse, apresentada como aqui está, é natural que se tirem precipitadas conclusões. Teria Capitu de fato traído Bentinho com o seu melhor amigo. Por isso é preciso ler na íntegra este livro maravilhoso, que coloca o escritor brasileiro entre os maiores ficcionistas do mundo. A história, como se sabe, é contada na perspectiva de Bento Santiago, um homem tomado de ciúme, para quem detalhes os mais prosaicos constituem prova inequívoca da presumível traição da mulher. O que importa, pois, o que lhe dá densidade e torna esta obra um monumento, na linha do que professou o crítico Michael Riffaterre, é o conflito humano vivido pelo personagem, o drama que o leva, como um Hamlet dos trópicos, a descer às profundezas do inferno, dilacerado pela dialética da dúvida e do ciúme. Se houve ou não adultério, pouco importa ou acrescentará ao livro. Ele se basta pelo que diz da trágica experiência amorosa de um homem. Pelo sofrimento que faz sofrer. Por esta razão, publicado na virada do século XIX, permanece vivo e continua a despertar o interesse e a paixão de tanta gente.
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que coisa estou estudando este assunto bem interesante por sinal gosto de cronicas mais animadas ja li o filme dom casmurro bem interesante.....
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